O que aconteceria se as tecnologias baseadas no vapor do século XIX tivessem sido ainda mais poderosas que em nossa realidade? E se, a exemplo do que podemos ver nos livros de Verne e Wells, os vitorianos tivessem conquistado o espaço, viajado no tempo? Essa pergunta está por trás de um subgênero da ficção científica chamado steampunk que já foi tema de um artigo aqui no Overmundo. No Brasil, a cultura steamer ganha cada vez mais força a ponto de, ainda este mês, acontecer em São Paulo um encontro que deve reunir fãs das diversas vertentes possíveis desse estilo em forma literária, cinematográfica, teatral, ligada a moda e acessórios, jogos e o que mais a imaginação permitir. O evento vai acontecer ao longo da madrugada de 27 de novembro, na Biblioteca Pública Viriato Corrêa, durante a III Fantástica Jornada Madrugada Adentro.
Graças aos esforços de um grupo de entusiastas, os steampunkers brasileiros contam com uma invejável estrutura virtual para trocar ideias, se manterem informados e organizar reuniões presenciais como essa. O Conselho Steampunk é uma organização de fãs sem fins lucrativos que se divide em iniciativas regionais – denominadas de Lojas – e que põe à disposição dos interessados uma variedade de projetos e ferramentas da web. O grau de profissionalismo é tão grande que chamou a atenção, entre outros, de Bruce Sterling, o escritor americano que, ao lado de William Gibson, criou as bases tanto do cyberpunk quanto do steampunk. Um empresário da área de informática morador do Rio de Janeiro está por trás de todo esse movimento nacional de cybervitorianismo: Bruno Accioly, um dos fundadores do Conselho Steampunk, que nos concedeu a entrevista a seguir.
De onde veio seu interesse pessoal na cultura steamer? Que obras steampunk, seja no cinema, na literatura, nos quadrinhos, nos games o atraíram para esse subgênero?
Uma coisa curiosa acerca do SteamPunk é que ele ganhou nome muito tarde. Muita gente já era fascinada, como eu, pelos livros e versões cinematográficas das obras de HG Wells e, particularmente, de Julio Verne. Posso dizer que foram estes dois autores que mais me chamaram a atenção - como referência de extrapolação e exagero da tecnologia e da sociedade da Era Vitoriana.
Havia contudo uma pletora de outras obras, como filmes antigos de Sherlock Holmes - e mesmo O Enigma da Pirâmide - a série As Aventuras de James West e a animação Viagem ao Centro da Terra, por exemplo, que estavam carregadas de elementos SteamPunk.
Creio que a primeira vez que tomei conhecimento do termo foi em fins da década de 1980, quando me chegou às mãos o Gurps SteamPunk e o Gurps Steam-Tech. Imediatamente me senti à vontade com o termo e... "entendi a piada".
Escrever obras no estilo de Verne, no Século XX e XXI é obviamente anacrônico, mas exerce um fascínio inegável sobre muita gente. É bom lembrar que apesar de A Máquina Diferencial [de Bruce Sterling e William Gibson] ser o primeiro romance consagrado do gênero, foi com K.W.Jeter, tentando descrever sua obra e as de Blaylock e Powers que surgiu pela primeira vez o termo.
Como exatamente surgiu a ideia para o Conselho Steampunk? De que forma aconteceram os primeiros contatos e a formatação dos diversos grupos abrigados nele?
Em meados de 2007 eu comecei a desenvolver um blog para falar de SteamPunk e, como queria fazer algo um pouco mais profissional para homenagear o gênero - que era muito menos conhecido no país - acabei adquirindo o domínio www.steampunk.com.br
Quando descobri o blog do Raul Cândido sobre o assunto, entrei em contato com ele assim que pude. O Conselho SteamPunk nasceu por telefone, quando percebemos que tanto o meu interesse quanto o dele eram grandes o suficiente para fazer algo pelo gênero e para começar a engendrar um movimento entorno dele.
A quantidade de pessoas e os grupos que se formaram ao redor do Conselho SteamPunk é uma função do conceito por trás da organização. Sabíamos que não seria possível tentar centralizar tudo e, portanto, resolvemos criar uma estrutura colaborativa, na qual qualquer pessoa, em qualquer estado, poderia criar sua Loja do Conselho SteamPunk e, com isso, poderia fazer uso da infraestrutura de Internet que elaboramos sem custo algum.
Quando uma Loja é formada ela é responsável pela promoção do gênero e pelo arrebanhar de mais entusiastas. No caso de um outro grupo na mesma região aparecer este passa a ser mais um núcleo daquela mesma Loja, o que aconteceu, por exemplo, com o núcleo SteamPunk de Bragança Paulista, que agregou-se a Loja São Paulo, e que é cheia de gente talentosa e interessada no futuro do movimento no país.
As representações regionais do Conselho são chamadas de Lojas a exemplo do que é feito na mais famosa das sociedades secretas. Essa terminologia chamou a atenção e arrancou elogios de ninguém menos que Bruce Sterling, um dos principais criadores da vertente literária Steampunk. Como surgiram os conceitos que batizam as várias iniciativas do Conselho? Foram ideias suas ou propostas do grupo?
Não foi nada difícil, na verdade. Acontece que tanto eu quanto o Raul, o Karl e tantos outros entusiastas que fazem parte do Conselho SteamPunk estamos imersos em vários aspectos da cultura Vitoriana e do gênero SteamPunk, e sempre que precisamos trabalhar algum conceito para uma nova iniciativa, acaba que alguém tem uma ideia interessante.
O espírito por trás da ideia do Conselho é de colaboração e generosidade e, portanto, não há muito espaço para líderes ou algo assim. Todos nutrimos profunda admiração uns pelos outros e pelos talentos e conhecimentos de cada um.
Acreditamos que a capacidade de cada Loja seja uma consequência direta do talento de cada um dos envolvidos no Conselho e estamos sempre buscando pessoas disponíveis, diligentes e interessadas em fazer mais pelo gênero e pelo movimento.
Atualmente quantas pessoas estão ligadas direta ou indiretamente ao Conselho Nacional e às lojas regionais? Entre membros que participam ativamente e pessoas que acompanham os diversos sites, blogs e dos eventos já organizados qual é o público estimado hoje do Conselho Steampunk?
Está aí algo difícil de dizer. O que se pode dizer é que existem quase 400 pessoas na comunidade do Orkut do Conselho, cerca de 250 pessoas na comunidade da Loja São Paulo e mais umas 100 pessoas nas comunidades das demais Lojas. Há ainda, claro, quase 800 pessoas na comunidade SteamPunk do Fábio Ori, que surgiu antes mesmo do Conselho SteamPunk existir.
Muitos entusiastas presentes nestas comunidades se repetem, logicamente, mas considerando-se as 200 pessoas cadastradas no Registro SteamPunk (precursor do SteamBook) - e as mais de 100 pessoas que entraram no SteamBook, a Rede Social SteamPunk, nas primeiras 3 semanas, nos parece possível que haja cerca de 1000 entusiastas declarados e muitos outros simpatizantes por aí.
Você poderia enumerar quais iniciativas existem atualmente com a chancela do Conselho, deixar os endereços e comentar brevemente cada uma?
Não são poucas... Como sou empresário e minha firma trabalha com Comunicação Digital e Mídias Sociais, acaba que boa parte destas iniciativas tem uma manifestação bem clara na Internet.
SteamPunk.com.br
Este é o site do Conselho SteamPunk, que costuma falar do gênero e do movimento em nível nacional.
Cada Loja tem seu próprio site:
- http://rj.steampunk.com.br/
- http://rs.steampunk.com.br/
- http://sp.steampunk.com.br/
- http://mg.steampunk.com.br/
E 3 outros estão para ser colocados no ar - quando da conclusão das Lojas:
- http://pa.steampunk.com.br/
- http://pr.steampunk.com.br/
- http://df.steampunk.com.br/
SteamCon - www.steamcon.com.br
Site dedicado a avisar os entusiastas dos eventos SteamPunk no país. O site é alimentado por cada uma das lojas e é também o lar da Virtual SteamCon, um evento de nível nacional que acontece via Internet.
SteamGirls - www.steamgirls.com.br
Site que dá lugar a sessões de fotos femininas de praticantes de SteamPlay e que divulga o trabalho de quem faz acessórios e trajes SteamPunk/Vitorianos.
SteamPedia - www.steampedia.com.br
A proposta da SteamPedia é ser como a WikiPedia, um enciclopédia alimentada por quem se interessa pelo assunto. Trata-se de uma iniciativa nova e poucos já se inscreveram de fato, mas qualquer um pode participar.
SteamBook - www.steambook.com.br
Rede Social SteamPunk, a melhor forma de participar do movimento e fazer diferença nele sem fazer parte efetivamente do Conselho SteamPunk. É possível construir ali seu blog a respeito do gênero e do movimento.
RetroFuturista - www.retrofuturista.com.br
Este site é uma proposta experimental de produção não-linear de ficção SteamPunk. A idéia é produzir um universo SteamPunk com licença Creative Commons que possa ser usado por outros autores como base para suas narrativas.
Temos ainda perfis nas seguintes mídias sociais:
Facebook - http://www.facebook.com/group.php?gid=38039372045
Orkut - http://www.orkut.com.br/Main#Profile.aspx?rl=fpp&uid=2382475252867688827
Comunidade no Orkut - http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=72139589
Twitter - http://twitter.com/consteampunk
SteamFeed - http://feeds.feedburner.com/steamfeed
Sobre o SteamFeed - http://www.steampunk.com.br/o-que-e-o-steamfeed/
E para o futuro próximo, quais são as expectativas de novos projetos e de criação de novas Lojas ligadas a seu grupo?
O grupo não é exatamente meu. Digo... ele foi fundado de forma a, se algo acontecer com qualquer um de nós, ele continue existindo. Na verdade, uma vez que a infraestrutura de hospedagem, messenger, e-mails e sites é montada pela minha empresa eu tomei o cuidado de deixar tudo esquematizado e pago por alguns anos, deixando o Conselho SteamPunk sadio mesmo no advento de batermos em um iceberg.
O futuro nos reserva algumas coisas interessantes, dentre elas a Liga de Artífices SteamPunk - que vai se manifestar no SteamCon.com.br como uma galeria de artistas e produtos; um PodCast convencional sobre o tema; um VidCast bem diferente do que já se viu; um RPG que lançará as bases para um trabalho de LARP (Live Action Role Playing) no Brasil; alguns SteamCamps - reuniões de pauta para colher os interesses dos entusiastas em cada estado; e uma SteamCon presencial, que deve acontecer em São Paulo, pelo que estamos vendo.
Na estreia da edição on line da RPG Magazine havia um conto seu chamado “Rota de fuga”. Foi seu primeiro conto steampunk? Vamos ver mais produção literária sua e de outros membros do Conselho?
Não foi meu primeiro conto SteamPunk. O primeiro foi sobre uma sociedade marciana baseada em vapor, que se passa antes do nascimento da raça humana e o segundo foi uma experiência literária pessoal na qual o vapor e a eletricidade eram entidades escravizadas pela raça humana no século XIX.
Estou trabalhando há alguns anos em duas histórias com temática SteamPunk e me preparando para lançar mais alguns contos.
Eu e alguns outros membros do Conselho estamos preparando algumas surpresas para os entusiastas, no sentido de produção literária SteamPunk e, creio, todos vão gostar muito do resultado.
Sempre fui um apaixonado pela ficção científica de um modo geral, independente do SteamPunk, e sou um fã incondicional de Arthur C.Clarke, ávido leitor de Isaac Asimov e admirador do trabalho de Carl Sagan, o que me levou a escrever muitos outros contos.
Tenho conhecido muita gente interessante e importante no meio, o que me fez perceber que o Conselho SteamPunk pode retribuir o carinho da comunidade de produção literária de Ficção Científica através das ferramentas que vem desenvolvendo para promoção do sub-gênero que tanto estimamos.
A nova iniciativa do Conselho SteamPunk, como resultado, não será endereçada a entusiastas de nicho, mas a toda comunidade de escritores e leitores de literatura fantástica.
O que ninguém ouviu até agora é o nome desta iniciativa, que foi batizada por nós de: aoLimiar.
Se o leitor tiver alguma dúvida, interesse em estreitar relações com o Conselho SteamPunk ou colaborar de alguma forma, basta enviar um e-mail para conselho@steampunk.com.br
terça-feira, 17 de novembro de 2009
segunda-feira, 9 de novembro de 2009
Empreitada transregional
Ele é natural de Brasília, trabalha em uma empresa de Florianópolis, lançou uma minissérie em quadrinhos em parceria com um desenhista de São Paulo que se passa em um universo ficcional cujo principal autor mora no Rio de Janeiro. Esse é um resumo simplificado da empreitada transregional vivida pelo roteirista de Eterno Retorno, a estreia do game espacial Taikodom no mundo das HQs. Nesta entrevista, o quadrinista também estreante fala da experiência de trocar o jornalismo pela ficção, detalha o processo de criação de um projeto que se espalhou pelo território nacional e dá uma ideia de como é viver entre o presente e um mundo paralelo do futuro. Com vocês, Rodrigo Octavio Nogueira de Castro Santos que, felizmente, simplificou seu nome artístico para Roctavio de Castro.
Você é jornalista e nasceu em Brasília. Como veio parar em Santa Catarina e a se interessar por ficção?
Vim para Santa Catarina fazer universidade em 1997, convivia com uma turma que sempre se interessou mais por jornalismo literário, pelas grandes entrevistas e grandes reportagens do que pelo que víamos na grande imprensa. Os caras que eu gostava de ler eram tão bons repórteres quanto excelentes escritores. Comecei a faculdade lendo Fausto Wolf, Fernando Morais, José Hamilton Ribeiro. Depois vieram os caras do new journalism: Truman Capote, Tom Wolfe, Gay Talese e, do lado mais porra-louca, o Hunter Thompson. Buenas, como nunca tive paciência para a grande imprensa, e nem a coragem e o desprendimento para me jogar no mundo atrás de grandes histórias, acabei caindo na ficção. :-)
E qual sua produção nessa área e como foi sua aproximação da Hoplon, a empresa que desenvolve o game Taikodom?
Na verdade, exceto por trabalhos acadêmicos, a HQ Taikodom: Eterno Retorno é a minha primeira publicação de ficção em si. Antes, trabalhei com roteiro audiovisual, cobertura de eventos esportivos, fui editor e repórter de alguns jornais comunitários e redator web. Quando entrei na Hoplon, tinha uma empresa de comunicação. Depois de um namoro inicial em outros projetos, fui contratado para escrever o conteúdo das primeiras versões do site do Taikodom. Tive que ser uma espécie de beta-reader, junto com o Tarqüínio [Teles, fundador e presidente da Hoplon] e o Cristovão [Buzzarello, um dos fundadores da empresa], das obras de universo ficcional (UF) do Gerson Lodi-Ribeiro. De lá pra cá, já são mais de cinco anos, período em que ajudei a documentar especificações da história taikodônica, ajudei a criar personagens, cenários e algumas tramas que fizeram parte das primeiras versões do game. Quando fui contratado oficialmente para trabalhar com o Universo Taikodom, tive que começar a estudar teoria literária por conta própria. Sempre gostei de fazer entrevistas, do diálogo possível, de contar histórias. Depois que estudei um pouco sobre o diálogos, enredos e criação de personagens, percebi que dava para misturar algumas coisas que aprendi no tipo de jornalismo que gostava com a criação e a edição literária. Desenvolver um personagem é como entrevistá-lo. Existem diversas técnicas narrativas, mas sua história tem que ser bem ambientada e bem contada.
Como foi o processo de escrita do roteiro dessa minissérie? E a parceria com o desenhista Eduardo Ferrara? Você pode descrever como foram os bastidores da criação daquelas páginas? Você mandava o texto de Santa Catarina, ele recebia em São Paulo, enviava o esboço de volta, o material era aprovado... Como foi isso na prática?
Dentre todas as outras atividades pelas quais fui responsável, os cinco episódios da série foram escritos nuns quatro anos. Em algumas épocas pude trabalhar nos roteiros e acompanhamento dos processos de arte com dedicação total. Mas tivemos também grandes intervalos nas entregas. Existem vários processos de se desenvolver quadrinhos do roteiro, passando pelos rascunhos, arte-final, colorização, até a editoração eletrônica dos textos e balões. Uma premissa do Universo Taikodom é que a Hoplon deve ter o controle criativo sobre todas as obras que são publicadas. Na maioria das vezes as obras são "encomendadas" para os autores, que as desenvolvem de acordo com a estratégia da empresa. Então optamos pelo tipo de roteiro que contém a descrição de planos de fundo, câmeras, expressões dos personagens, legendas e diálogos quadro a quadro. Esse roteiro é enviado ao Ferrara e sua equipe que, muitas vezes cria em cima, modifica, dá mais ritmo, cores e mais movimento na proposta original. Aprovamos todos os estágios, com uma alteração aqui e outra ali. Nos primeiros episódios teve que ser assim, um trabalho hercúleo mesmo, inclusive com todo aquele trabalho de desenvolvimento de cenários, figurinos, naves e tecnologias do século 23. Com o passar dos tempos foi ficando mais fácil. Nesse último episódio, por exemplo, em algumas páginas eu fiz mais uma marcação de cenas e descrição de quadros tipo storyboard, com o tom dramático e o que os personagens iam dizer. Agora no final reescrevi muito do texto original dos balões até para tentar dar o mesmo tom para os cinco episódios da série, que foi escrita durante todo esse tempo.
Qual foi a participação de outros criadores do universo ficcional do Taikodom no texto final, como Tarqüínio Teles, que é o idealizador original do conceito, por exemplo?
Os outros criadores do universo ficcional acompanharam de perto os primeiros episódios, a aprovação de personagen estrutura geral da trama, com início, meio e fim. Ultimamente temos aprovado nossas obras em colóquios onde eu, Tarqüinio, João Marcelo Beraldo, Gerson Lodi-Ribeiro, Paulo de Tarso (PDT) e outros envolvidos indiretamente nos trancamos numa sala por dois dias. Depois, cada autor sai com o dever de casa de desenvolver sua obra dentro do que foi conversado. Atualmente eu assino como editor responsável no final e boa parte do meu tempo é dedicado a primeira leitura e edição das obras. Mas na prática funcionamos como um conselho editorial. O Tarqüinio dá a última palavra.
Como foi a decisão de usar na revista um visual cartunesco diferenciado do estilo dos gráficos realistas do jogo?
Essa decisão foi mais em função da escolha do Ferrara e da avaliação dos seus trabalhos e currículo na época. Seu estilo característico veio junto. Poucos ilustradores no Brasil tratariam de cada estágio da arte desenvolvida para nossos quadrinhos com tanto carinho e dedicação. Isso é complicado ao longo de trabalhos desenvolvidos em períodos longos se levarmos em conta a agenda corrida desse tipo de profissional.
O desenhista Eduardo Ferrara lista mangás e quadrinhos do braço italiano da Disney entre as influências dele nos quadrinhos. E quais são as suas, entre roteiristas e escritores, dentro e fora da ficção científica?
Roteiristas: Os hors concours: Will Eisner, Alan Moore e Neil Gaiman. Depois vem Alexandro Jodorowsky. Abaixo deles no mesmo patamar: Mark Millar, Warren Ellis, Garth Ennis, Grant Morrison. Escritores: Gerson Lodi-Ribeiro. :-) São muitos e muitos: Mas vou listar mais os fora (ou na fronteira) da ficção científica: Italo Calvino, Julio Cortázar, Edgar Allan Poe, Will Self, Chuck Palahniuk, Pedro Juan Gutierrez, Fausto Wolf, Rubem Fonseca e Dalton Trevisan. Na Sci-fi mais "atual" posso citar três caras que me inspiraram muito no Eterno Retorno: Charles Stross, Vernor Vinge e Richard K. Morgan. Roteiristas/diretores de cinema: Oliver Stone, David Cronenberg, Martin Scorsese, James Cameron, Stanley Kubrick, e Chan-wook Park.
Vai haver novos lançamentos de quadrinhos explorando o universo Taikodom? Já existe algo planejado ou pelo menos a ideia de como vão ser os novos projetos?
Nada ainda no nosso cronograma de lançamentos, aliás temos muitas obras literárias prontas na fila. Mas, se eu pudesse escolher, pensaria em novos projetos num tom mais realista e sombrio, talvez em preto e branco ou em mangás tradicionais.
Você é o editor de conteúdo do universo ficcional de Taikodom. Como é o seu dia-a-dia na empresa e o relacionamento com os demais criadores da casa, como Gerson Lodi-Ribeiro, que mora no Rio de Janeiro, e J. M. Beraldo, seu colega de trabalho em Florianópolis? Há reuniões virtuais constantes para ajustar a sintonia fina do processo?
Quinzenalmente promovemos mini-colóquios de algumas horas via Skype. Semestralmente, ou quando surge uma necessidade urgente, nos reunimos num colóquio de dois dias aqui em Florianópolis. Temos uma lista de email interna onde trocamos referências, perguntas e respostas quase que diariamente. Também passo na sala onde o Beraldo trabalha junto com o PDT, ou intercepto eles no cafezinho ou corredor (o Beraldo está sempre de um lado pro outro devido a suas atribuições de líder de conteúdo do game e interações com outros departamentos) quase todos os dias também. E o Tarquinio, sempre que pode ou que está aqui, passa nas nossas salas para bater um papo.
Está fazendo um ano exatamente que o jogo foi aberto aos interessados e a Hoplon acaba de fechar uma parceria para levá-lo a mais de 30 países. Como estão as expectativas relacionadas aos produtos derivados, como a HQ e os livros? Eles também devem ser lançados em outros mercados?
Temos a intenção e já estamos iniciando algumas conversas. Nos mercados onde a Devir alcança vamos sair com eles e/ou parceiros. O apoio da Devir na pessoa do Douglas Quinta Reis tem sido fundamental para concretizarmos nossas publicações e já temos muitos planos para o futuro.
E quais são os seus projetos futuros? Vai fazer mais roteiros de HQs? Há algum texto literário em vista? Pretende escrever algo além das criações internas do Taikodom?
Tenho outros projetos pessoais de quadrinhos e até livros dentro e fora do UF Taikodom já pensados para a frente. Mas como já vivo 24 horas por dia num mundo paralelo do futuro, nunca consegui tempo para desenvolvê-los no presente. Um dia consigo.
Você é jornalista e nasceu em Brasília. Como veio parar em Santa Catarina e a se interessar por ficção?
Vim para Santa Catarina fazer universidade em 1997, convivia com uma turma que sempre se interessou mais por jornalismo literário, pelas grandes entrevistas e grandes reportagens do que pelo que víamos na grande imprensa. Os caras que eu gostava de ler eram tão bons repórteres quanto excelentes escritores. Comecei a faculdade lendo Fausto Wolf, Fernando Morais, José Hamilton Ribeiro. Depois vieram os caras do new journalism: Truman Capote, Tom Wolfe, Gay Talese e, do lado mais porra-louca, o Hunter Thompson. Buenas, como nunca tive paciência para a grande imprensa, e nem a coragem e o desprendimento para me jogar no mundo atrás de grandes histórias, acabei caindo na ficção. :-)
E qual sua produção nessa área e como foi sua aproximação da Hoplon, a empresa que desenvolve o game Taikodom?
Na verdade, exceto por trabalhos acadêmicos, a HQ Taikodom: Eterno Retorno é a minha primeira publicação de ficção em si. Antes, trabalhei com roteiro audiovisual, cobertura de eventos esportivos, fui editor e repórter de alguns jornais comunitários e redator web. Quando entrei na Hoplon, tinha uma empresa de comunicação. Depois de um namoro inicial em outros projetos, fui contratado para escrever o conteúdo das primeiras versões do site do Taikodom. Tive que ser uma espécie de beta-reader, junto com o Tarqüínio [Teles, fundador e presidente da Hoplon] e o Cristovão [Buzzarello, um dos fundadores da empresa], das obras de universo ficcional (UF) do Gerson Lodi-Ribeiro. De lá pra cá, já são mais de cinco anos, período em que ajudei a documentar especificações da história taikodônica, ajudei a criar personagens, cenários e algumas tramas que fizeram parte das primeiras versões do game. Quando fui contratado oficialmente para trabalhar com o Universo Taikodom, tive que começar a estudar teoria literária por conta própria. Sempre gostei de fazer entrevistas, do diálogo possível, de contar histórias. Depois que estudei um pouco sobre o diálogos, enredos e criação de personagens, percebi que dava para misturar algumas coisas que aprendi no tipo de jornalismo que gostava com a criação e a edição literária. Desenvolver um personagem é como entrevistá-lo. Existem diversas técnicas narrativas, mas sua história tem que ser bem ambientada e bem contada.
Como foi o processo de escrita do roteiro dessa minissérie? E a parceria com o desenhista Eduardo Ferrara? Você pode descrever como foram os bastidores da criação daquelas páginas? Você mandava o texto de Santa Catarina, ele recebia em São Paulo, enviava o esboço de volta, o material era aprovado... Como foi isso na prática?
Dentre todas as outras atividades pelas quais fui responsável, os cinco episódios da série foram escritos nuns quatro anos. Em algumas épocas pude trabalhar nos roteiros e acompanhamento dos processos de arte com dedicação total. Mas tivemos também grandes intervalos nas entregas. Existem vários processos de se desenvolver quadrinhos do roteiro, passando pelos rascunhos, arte-final, colorização, até a editoração eletrônica dos textos e balões. Uma premissa do Universo Taikodom é que a Hoplon deve ter o controle criativo sobre todas as obras que são publicadas. Na maioria das vezes as obras são "encomendadas" para os autores, que as desenvolvem de acordo com a estratégia da empresa. Então optamos pelo tipo de roteiro que contém a descrição de planos de fundo, câmeras, expressões dos personagens, legendas e diálogos quadro a quadro. Esse roteiro é enviado ao Ferrara e sua equipe que, muitas vezes cria em cima, modifica, dá mais ritmo, cores e mais movimento na proposta original. Aprovamos todos os estágios, com uma alteração aqui e outra ali. Nos primeiros episódios teve que ser assim, um trabalho hercúleo mesmo, inclusive com todo aquele trabalho de desenvolvimento de cenários, figurinos, naves e tecnologias do século 23. Com o passar dos tempos foi ficando mais fácil. Nesse último episódio, por exemplo, em algumas páginas eu fiz mais uma marcação de cenas e descrição de quadros tipo storyboard, com o tom dramático e o que os personagens iam dizer. Agora no final reescrevi muito do texto original dos balões até para tentar dar o mesmo tom para os cinco episódios da série, que foi escrita durante todo esse tempo.
Qual foi a participação de outros criadores do universo ficcional do Taikodom no texto final, como Tarqüínio Teles, que é o idealizador original do conceito, por exemplo?
Os outros criadores do universo ficcional acompanharam de perto os primeiros episódios, a aprovação de personagen estrutura geral da trama, com início, meio e fim. Ultimamente temos aprovado nossas obras em colóquios onde eu, Tarqüinio, João Marcelo Beraldo, Gerson Lodi-Ribeiro, Paulo de Tarso (PDT) e outros envolvidos indiretamente nos trancamos numa sala por dois dias. Depois, cada autor sai com o dever de casa de desenvolver sua obra dentro do que foi conversado. Atualmente eu assino como editor responsável no final e boa parte do meu tempo é dedicado a primeira leitura e edição das obras. Mas na prática funcionamos como um conselho editorial. O Tarqüinio dá a última palavra.
Como foi a decisão de usar na revista um visual cartunesco diferenciado do estilo dos gráficos realistas do jogo?
Essa decisão foi mais em função da escolha do Ferrara e da avaliação dos seus trabalhos e currículo na época. Seu estilo característico veio junto. Poucos ilustradores no Brasil tratariam de cada estágio da arte desenvolvida para nossos quadrinhos com tanto carinho e dedicação. Isso é complicado ao longo de trabalhos desenvolvidos em períodos longos se levarmos em conta a agenda corrida desse tipo de profissional.
O desenhista Eduardo Ferrara lista mangás e quadrinhos do braço italiano da Disney entre as influências dele nos quadrinhos. E quais são as suas, entre roteiristas e escritores, dentro e fora da ficção científica?
Roteiristas: Os hors concours: Will Eisner, Alan Moore e Neil Gaiman. Depois vem Alexandro Jodorowsky. Abaixo deles no mesmo patamar: Mark Millar, Warren Ellis, Garth Ennis, Grant Morrison. Escritores: Gerson Lodi-Ribeiro. :-) São muitos e muitos: Mas vou listar mais os fora (ou na fronteira) da ficção científica: Italo Calvino, Julio Cortázar, Edgar Allan Poe, Will Self, Chuck Palahniuk, Pedro Juan Gutierrez, Fausto Wolf, Rubem Fonseca e Dalton Trevisan. Na Sci-fi mais "atual" posso citar três caras que me inspiraram muito no Eterno Retorno: Charles Stross, Vernor Vinge e Richard K. Morgan. Roteiristas/diretores de cinema: Oliver Stone, David Cronenberg, Martin Scorsese, James Cameron, Stanley Kubrick, e Chan-wook Park.
Vai haver novos lançamentos de quadrinhos explorando o universo Taikodom? Já existe algo planejado ou pelo menos a ideia de como vão ser os novos projetos?
Nada ainda no nosso cronograma de lançamentos, aliás temos muitas obras literárias prontas na fila. Mas, se eu pudesse escolher, pensaria em novos projetos num tom mais realista e sombrio, talvez em preto e branco ou em mangás tradicionais.
Você é o editor de conteúdo do universo ficcional de Taikodom. Como é o seu dia-a-dia na empresa e o relacionamento com os demais criadores da casa, como Gerson Lodi-Ribeiro, que mora no Rio de Janeiro, e J. M. Beraldo, seu colega de trabalho em Florianópolis? Há reuniões virtuais constantes para ajustar a sintonia fina do processo?
Quinzenalmente promovemos mini-colóquios de algumas horas via Skype. Semestralmente, ou quando surge uma necessidade urgente, nos reunimos num colóquio de dois dias aqui em Florianópolis. Temos uma lista de email interna onde trocamos referências, perguntas e respostas quase que diariamente. Também passo na sala onde o Beraldo trabalha junto com o PDT, ou intercepto eles no cafezinho ou corredor (o Beraldo está sempre de um lado pro outro devido a suas atribuições de líder de conteúdo do game e interações com outros departamentos) quase todos os dias também. E o Tarquinio, sempre que pode ou que está aqui, passa nas nossas salas para bater um papo.
Está fazendo um ano exatamente que o jogo foi aberto aos interessados e a Hoplon acaba de fechar uma parceria para levá-lo a mais de 30 países. Como estão as expectativas relacionadas aos produtos derivados, como a HQ e os livros? Eles também devem ser lançados em outros mercados?
Temos a intenção e já estamos iniciando algumas conversas. Nos mercados onde a Devir alcança vamos sair com eles e/ou parceiros. O apoio da Devir na pessoa do Douglas Quinta Reis tem sido fundamental para concretizarmos nossas publicações e já temos muitos planos para o futuro.
E quais são os seus projetos futuros? Vai fazer mais roteiros de HQs? Há algum texto literário em vista? Pretende escrever algo além das criações internas do Taikodom?
Tenho outros projetos pessoais de quadrinhos e até livros dentro e fora do UF Taikodom já pensados para a frente. Mas como já vivo 24 horas por dia num mundo paralelo do futuro, nunca consegui tempo para desenvolvê-los no presente. Um dia consigo.
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
As mortes serão breves
Durante 170 anos Gao Jung esteve morto. Para desespero dele, tal período de hibernação involuntária, entre 2070 e 2240, deve ser sua experiência mais próxima daquilo que hoje em dia ainda chamamos de descanso eterno, pois, na nova realidade em que passou a viver, o rapaz está condenado a ser imortal. No máximo, ao ser abatido, Jung vai conseguir breves pausas nas missões que seus novos patrões lhe impuserem para, logo em seguida, ser despertado mais uma vez, com as memórias reimplantadas em um novo corpo, clonado e adaptado para melhor servir a interesses que não são os dele. “Se a morte é temporária, qual é o sentido da vida?” A pergunta é o mote por trás da minissérie Eterno Retorno, a primeira inclusão do universo ficcional do videogame on line Taikodom na área dos quadrinhos. História dividida em cinco capítulos e em dois volumes – o primeiro, lançado este mês nas livrarias, reúne os dois episódios iniciais; para novembro está programado o lançamento dos outros três no segundo e último álbum da série – a aventura assinada pelo roteirista Roctavio de Castro e pelo desenhista Eduardo Ferrara marca o primeiro aniversário da abertura do jogo ao público, fato que se deu no dia 27 de outubro de 2008. Além disso, é mais uma fronteira desbravada pelo projeto que conta com dois livros lançados, um romance e uma coletânea de contos, o primeiro deles já resenhado aqui.
Game, romance, contos e quadrinhos são diversas entradas para o mesmo universo, um futuro altamente tecnológico no qual a humanidade dominou o espaço – significado do termo Taikodom – mas perdeu o contato com o planeta Terra. A base do projeto é a capital catarinense, onde está localizada a Hoplon Infotainment, que desenvolve o jogo com uma equipe de aproximadamente 100 profissionais e logo deve exportá-lo, graças a uma parceria com uma empresa californiana, para mais de 30 países. Quanto ao universo ficcional expandido para além da tela dos computadores, ele é criado em conjunto com escritores e artistas de diversos estados – Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro – em outra parceria, com a editora Devir, que distribui os livros e revistas para todo o Brasil e logo deve fazer o mesmo em outros territórios. Eterno Retorno é um exemplo dessa interação à distância, uma vez que Roctavio de Castro mora há 12 anos em Florianópolis, de onde escreveu o texto da série, e Eduardo Ferrara mantém seu estúdio em São Paulo, e de lá desenhou e arte-finalizou a HQ, repassando as cores para os cuidados de sua equipe do Imaginos.
O roteiro se divide para acompanhar o protagonista em dois momentos, suas memórias de um passado terrestre no século XXI e o impacto da ressurreição dele no espaço em pleno século XXIII. O trabalho se vale da alteração dos focos narrativos e fartas elipses. Nos flashes de 2070, Gao Jung trabalha com uma parceira, bem íntima, para reaver objetos cobiçados por um grupo criminoso. Aos poucos, com vislumbres pingados ao longo das páginas, podemos perceber que as coisas se complicaram para a dupla e que o policial é acusado da morte da companheira, julgado, condenado e posto em hibernação. Depois do salto cronológico, ele é considerado útil para os interesses da casta que manda no Taikodom, os Spacers. Ao ser descongelado, ganha uma companhia indesejada. Sua mente passa a compartilhar pensamentos com uma inteligência artificial geniosa que orienta o terráqueo naquele novo mundo e faz o arquivamento de suas memórias para possibilitar o reimplante, caso o corpo do hospedeiro seja destruído. Vale comentar que essa consciência inorgânica, chamada OTTOBA7, ganha vida no Twitter com um perfil alimentado por seu criador no qual faz postagens sobre temas como o pós-humanismo e a singularidade tecnológica.
Já os dinâmicos desenhos da minissérie seguem uma proposta estética bem diferente dos gráficos do jogo, apesar de a identidade visual das várias naves espaciais estar bem preservada e os cenários hi tech apresentados serem muito convincentes. O visual dos personagens da HQ não foi trabalhado nos formatos tridimensionais de um game, mas como algo bem mais voltado para o estilo cartunesco, quase um meio termo entre o que se poderia esperar de uma obra para leitores adultos, como anunciado na capa, e gibis feitos para crianças. Com isso, mesmo em momentos de dramaticidade, o traço às vezes lembra bastante material mais voltado ao humor. A explicação pode estar nas influências reconhecidas pelo desenhista, que lista como tal os mangás e a produção italiana de quadrinhos Disney. De fato, a arte me lembrou bastante a da revista Donald Super, versão nacional que a editora Abril lançou por aqui em 2003 da PK italiana: uma publicação que mostrava o famoso pato vivendo aventuras de ação e FC. Mesmo bem sucedida no país europeu, a proposta não fez muito sucesso no Brasil.
O resultado desse esforço interestadual dos autores é a resposta para aquela pergunta filosófica que começa a ser esboçada no primeiro álbum. “Se a morte é temporária, qual é o sentido da vida?” Não apenas pelos rumos da história, mas por várias citações, algumas bem explícitas, outras menos, essa ideia e a da reiteração do conceito por trás do título da série estão espalhadas por toda a parte. Seja no trecho de um dos livros mais conhecidos de Friedrich Nietezsche escolhido para abrir o primeiro episódio; seja no título do segundo, “Sísifo”, remetendo ao mortal condenado pelos deuses gregos a repetir uma tarefa sem sentido eternamente; ou ainda no logotipo da revista que entrelaça as últimas letras das palavras eterno retorno para obter o símbolo matemático do infinito. No próximo mês, deveremos ver mais respostas para a pergunta que tanto atormenta Gao Jung.
Game, romance, contos e quadrinhos são diversas entradas para o mesmo universo, um futuro altamente tecnológico no qual a humanidade dominou o espaço – significado do termo Taikodom – mas perdeu o contato com o planeta Terra. A base do projeto é a capital catarinense, onde está localizada a Hoplon Infotainment, que desenvolve o jogo com uma equipe de aproximadamente 100 profissionais e logo deve exportá-lo, graças a uma parceria com uma empresa californiana, para mais de 30 países. Quanto ao universo ficcional expandido para além da tela dos computadores, ele é criado em conjunto com escritores e artistas de diversos estados – Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro – em outra parceria, com a editora Devir, que distribui os livros e revistas para todo o Brasil e logo deve fazer o mesmo em outros territórios. Eterno Retorno é um exemplo dessa interação à distância, uma vez que Roctavio de Castro mora há 12 anos em Florianópolis, de onde escreveu o texto da série, e Eduardo Ferrara mantém seu estúdio em São Paulo, e de lá desenhou e arte-finalizou a HQ, repassando as cores para os cuidados de sua equipe do Imaginos.
O roteiro se divide para acompanhar o protagonista em dois momentos, suas memórias de um passado terrestre no século XXI e o impacto da ressurreição dele no espaço em pleno século XXIII. O trabalho se vale da alteração dos focos narrativos e fartas elipses. Nos flashes de 2070, Gao Jung trabalha com uma parceira, bem íntima, para reaver objetos cobiçados por um grupo criminoso. Aos poucos, com vislumbres pingados ao longo das páginas, podemos perceber que as coisas se complicaram para a dupla e que o policial é acusado da morte da companheira, julgado, condenado e posto em hibernação. Depois do salto cronológico, ele é considerado útil para os interesses da casta que manda no Taikodom, os Spacers. Ao ser descongelado, ganha uma companhia indesejada. Sua mente passa a compartilhar pensamentos com uma inteligência artificial geniosa que orienta o terráqueo naquele novo mundo e faz o arquivamento de suas memórias para possibilitar o reimplante, caso o corpo do hospedeiro seja destruído. Vale comentar que essa consciência inorgânica, chamada OTTOBA7, ganha vida no Twitter com um perfil alimentado por seu criador no qual faz postagens sobre temas como o pós-humanismo e a singularidade tecnológica.
Já os dinâmicos desenhos da minissérie seguem uma proposta estética bem diferente dos gráficos do jogo, apesar de a identidade visual das várias naves espaciais estar bem preservada e os cenários hi tech apresentados serem muito convincentes. O visual dos personagens da HQ não foi trabalhado nos formatos tridimensionais de um game, mas como algo bem mais voltado para o estilo cartunesco, quase um meio termo entre o que se poderia esperar de uma obra para leitores adultos, como anunciado na capa, e gibis feitos para crianças. Com isso, mesmo em momentos de dramaticidade, o traço às vezes lembra bastante material mais voltado ao humor. A explicação pode estar nas influências reconhecidas pelo desenhista, que lista como tal os mangás e a produção italiana de quadrinhos Disney. De fato, a arte me lembrou bastante a da revista Donald Super, versão nacional que a editora Abril lançou por aqui em 2003 da PK italiana: uma publicação que mostrava o famoso pato vivendo aventuras de ação e FC. Mesmo bem sucedida no país europeu, a proposta não fez muito sucesso no Brasil.
O resultado desse esforço interestadual dos autores é a resposta para aquela pergunta filosófica que começa a ser esboçada no primeiro álbum. “Se a morte é temporária, qual é o sentido da vida?” Não apenas pelos rumos da história, mas por várias citações, algumas bem explícitas, outras menos, essa ideia e a da reiteração do conceito por trás do título da série estão espalhadas por toda a parte. Seja no trecho de um dos livros mais conhecidos de Friedrich Nietezsche escolhido para abrir o primeiro episódio; seja no título do segundo, “Sísifo”, remetendo ao mortal condenado pelos deuses gregos a repetir uma tarefa sem sentido eternamente; ou ainda no logotipo da revista que entrelaça as últimas letras das palavras eterno retorno para obter o símbolo matemático do infinito. No próximo mês, deveremos ver mais respostas para a pergunta que tanto atormenta Gao Jung.
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
Uma fábula sobre o medo
O ambiente é marcado por um clima instável, com enchentes, pequenas nevadas, ciclones e grandes variações na temperatura. No campo político, um novo governo pratica uma espécie de ditadura não assumida, mantendo a ordem através de altos impostos e de uma força policial fortemente armada que atua de maneira brutal. Nesse contexto, um grupo de jovens – escondendo seu rosto atrás de máscaras e atuando sob o mesmo nome – descontentes com a situação do ambiente à sua volta, planeja pequenos atos de desobediência civil. Ainda que atuando de forma pacífica, em um destes atos algo acontece de forma imprevista, causando a explosão de uma bomba. Enquanto tentam provar sua inocência e justificar suas ações, o fim parece estar cada vez mais próximo.
A descrição acima foi feita pelo próprio autor e se refere à sua cidade natal, Florianópolis, em um futuro próximo, no qual se passa seu projeto de história em quadrinhos. Promessas de amor a desconhecidos enquanto espero o fim do mundo é o nome deste projeto, de autoria de Pedro Franz, 26 anos. Programada como uma série em 12 capítulos, com tamanho variando entre 12 e 16 páginas cada um, a HQ havia sido publicamente anunciada no dia 12 de abril deste ano, quando o quadrinista inaugurou o blog Notas sobre o fim por onde ele pretende publicar o material na íntegra, deixando-o disponível para download gratuito em arquivos em .pdf. O primeiro deles, surgiu no início de julho e o segundo no final de setembro. Além disso, ele abriu um fórum para discutir a obra e suas influências com sua audiência: “O objetivo deste espaço é aprofundar uma investigação que relacione teoria e prática e funcionar como ferramenta de relação entre autor e público” escreveu no blog. “Além de utilizá-lo para apresentar o projeto – ou seja, a história em quadrinhos – pretendo postar textos sobre a produção da obra, imagens, esboços, novidades, autores que me influenciaram.”
A série atual não é a primeira experiência de Franz com os quadrinhos. Entre 2002 e 2003 ele produziu duas edições de um zine chamado Café com Leite, mas como me disse em uma conversa num bar da cidade onde se passa sua história atual, não era algo sério ou pretensioso. Naquela mesma época, também foi convidado a participar de uma mostra de quadrinhos ligada ao Salão de Humor de Piracicaba, mas com proposta diferente daquela ligada ao título do famoso evento do interior de São Paulo: os trabalhos expostos não eram humorísticos. Então veio uma pausa nessa breve relação com o meio. Em um intervalo de meia década, ele morou por dois anos na capital da Argentina; recobrou o interesse pelas historietas; descobriu publicações daquele país, como a Fierro; e quando retornou ao Brasil e a seu curso acadêmico, na UFSC, apresentou como trabalho de conclusão do curso de design uma monografia ligada ao tema. “A quarta dimensão do trabalho de Breccia” acabou sendo agraciado, agora em 2009, com o troféu HQ Mix – mais importante prêmio dedicado ao quadrinho nacional. Nesse TCC, Franz procurou fazer a ponte entre HQs, design e arte ao analisar a obra do uruguaio Alberto Breccia (1919-93), o artista que mais admira neste meio. Outros autores que ele cita como possíveis influências são o argentino José Muñoz e o japonês Taiyo Matsumoto.
Com esse retorno, Franz começou a processar as ideias que dariam origem à Promessas... vamos abreviar aqui o título quilométrico. Aliás, o gosto por longos títulos parece ser uma característica do autor, que também cursou Artes Plásticas, pois um outro projeto de HQ, paralelo, leva o nome de Uma casa construída com cascas de ovos. Apesar de ter mais páginas concluídas que o atual, o próprio quadrinista reconhece que esse ainda vai demorar mais a aparecer. “Mas é um trabalho bonito, eu acho.” Retornemos às promessas e ao fim do mundo. Vamos falar das páginas, as originais, que o autor trouxe para mostrar naquele bar, na rua que leva o nome do pintor Victor Meirelles (1832-1903), antes do anúncio do prêmio HQ Mix deste ano. A primeira surpresa possível, em se tratando de alguém que escolheu o meio digital para divulgar sua obra, é o método de trabalho do autor. Franz optou por utilizar a forma mais tradicional para produzir sua HQ: nanquim, pincel e papel.
As folhas A2 que ele exibe sobre a mesa na noite mais gelada do ano em Florianópolis foram ilustradas exatamente como fariam os quadrinistas que o inspiraram, em um mundo anterior ao das webcomics. Franz esboça a lápis e depois cobre os desenhos com a tinta negra, criando contrastes, dando a ilusão de volume, áreas de luz e sombras. Ele prevê na arte os espaços para os balões, com a fala dos personagens, e mesmo o letreiramento é feito à mão, e inserido mais tarde quando entram em ação os softwares. O InDesign ajuda no momento da diagramação. Já o Photoshop corrige a perda de contraste que às vezes ocorre com o escaneamento das imagens e é usado para aplicar o cinza, tomando o lugar das antigas retículas, material que não é tão fácil para ser encontrado pelos quadrinistas do século XXI quanto era pelos profissionais do século anterior. O processo é lento, como não poderia deixar de ser. Já houve momentos em que ele, que procura trabalhar na série todos os dias, passou duas horas dedicado a um único quadrinho.
Tudo é feito do modo mais tradicional possível até porque Promessas... foi pensada, planejada e está sendo executada como uma obra a ser impressa, publicada de modo clássico. “A Internet surge por necessidade”, ele comenta, apesar de que, com o tempo, essa mídia tenha revelado novas possibilidades a serem exploradas. Até por sugestão de um editor com quem conversou, o catarinense concordou que o melhor modo de tornar seu trabalho conhecido era a divulgação pela rede. Se existe algum lugar em que um autor iniciante pode contar com uma edição impressa de seu primeiro trabalho de fôlego, com aproximadamente 200 páginas, este não é o Brasil. Então, o catarinense escolheu esta forma para divulgar e distribuir por partes sua série, tendo a consciência de que vivemos uma nova realidade, com licença livre, ou seja, adotando o esquema copyleft. Já há um site que, no lugar de fazer um link ao blog de Franz, criou novo arquivo e deixou disponível o primeiro capítulo em seu próprio domínio, uma espécie de pirataria consentida. “Tu perde o controle daquilo”, reconhece. “Quero que pirateiem muito mais, que imprimam, xeroquem”.
Ele calcula que nas primeiras semanas de exposição do primeiro capítulo, uma média de 20 pessoas baixou o arquivo diariamente. Esta acabou se revelando uma possibilidade de democratizar o acesso à obra, ainda que a leitura no computador não seja a ideal. Afinal, ao contrário de outras mídias, como a música, em que, em última análise, não há perda na transposição para um meio digital, os quadrinhos clássicos ainda contam como um bastião do paradigma de Walter Benjamim: as páginas ainda conservam uma certa “aura” e assim vai ser, até o momento em que se encontre o modo de garantir a reprodutilibilidade técnica perfeita na tela de um leitor eletrônico portátil. Até lá, o papel e as HQs ainda vão manter seu casamento secular. Para facilitar essa materialização futura, Promessas... foi composta em preto e branco e sua dúzia de capítulos podem ser agrupados em três álbuns.
Uma amostra do que os leitores podem esperar já está disponível na rede. Pedro Franz diz que pensou em um conceito-chave para elaborar esta sua obra: o “medo”. Isso está presente desde o primeiro post naquele seu blog, quando ele esboçou o que viria a ser a série:
Autotomia é o nome dado à capacidade que alguns animais possuem de se auto-mutilar em situações de perigo como estratégia de sobrevivência. Deixar algo morrer para preservar a vida. Diante da necessidade de enfrentar um perigo, lutar ou fugir, funciona como um mecanismo de defesa para se sobreviver. Partindo destes conceitos, Promessas de amor a desconhecidos enquanto espero o fim do mundo é uma fábula sobre o “medo” funcionando como crítica à moral burguesa e à intolerância contada em formato de Peter Pan pós-moderno.
Assim como a Internet surgiu para facilitar e difundir – e está servindo para promover um rico debate sobre os quadrinhos contemporâneos na seção de comentários do blog – a ambientação futurista veio para dar mais liberdade ao autor. A característica típica de ficção científica é para permitir ao artista falar do presente usando o subterfúgio de se referir ao futuro. Ele mesmo escreveu que, em um primeiro momento, pensou em criar cenários mais elaborados, com pontes destruídas, a Ilha isolada, novas formas de governo e de autoritarismo naquele ambiente ficcional. Mas preferiu apenas potencializar o que já vê nos dias de hoje de modo a analisar as ações e reações provocadas por aquele sentimento – o medo – como ele é capaz de mover as pessoas e o que pode gerar em resposta. Um modo, com algum afastamento brechtiano, de estudar temas como terrorismo, pirataria, repressão política e policial em um cenário ao mesmo tempo conhecido e estranho, particular e universal.
Ainda é cedo para falar sobre Promessas... como uma obra integral e se ela vai ser capaz de amarrar todos os instigantes pontos que se propõe a abordar. Os primeiros capítulos, que estão disponíveis para todos lerem e julgarem, abrem com uma abordagem bem intimista, como um painel das impressões coletivas dos diversos personagens, vários pontos de vista compondo um plano geral. A arte me lembrou, de fato, o trabalho de um dos quadrinistas relacionados pelo autor, Taiyo Matsumoto: o mangá underground Preto e Branco, publicado no Brasil pela Conrad. Mas me lembrou bem mais, na construção dos personagens, o brasileiro Lourenço Mutarelli que, pelo menos conscientemente, não faz parte daquela lista já citada por Franz. Quanto aos conceitos, em um primeiro momento me fez pensar mais em material anglo-saxão que em obras latino-americanas: como DMZ – também conhecida como ZDM, de zona desmilitarizada, no Brasil – do americano Brian Wood, e Invisíveis, a série mais autoral do britânico Grant Morrison. Vou aguardar os próximos 10 capítulos da obra deste já premiado autor para ver como se desenvolve este futuro alternativo e distópico de Florianópolis.
segunda-feira, 17 de agosto de 2009
Engrenagens aparentes
Uma espécie de nova Revolução Industrial chega ao Brasil e atrai interesse internacional. Chamada ao gosto do freguês de modismo, tendência, hype, cultura, manifesto, tribo urbana, estilo entre outras classificações a verdade é que o steampunk conquista adeptos, ganha forças na Internet, em eventos públicos e até na literatura e nos quadrinhos, como uma vertente da ficção científica. Pelo nome e pelo parentesco com a FC mesmo quem nunca ouviu falar – ou que não tenha ligado o termo à realidade prática – deve imaginar que exista semelhança estética ou filosófica com o cyberpunk, tão popular que praticamente é sinônimo do gênero como um todo para muita gente que consumiu livros, filmes, HQs e jogos de RPG nos últimos vinte anos. De fato, a semelhança é real, se o foco de uma é especular sobre a cibernética em um futuro próximo, a da outra é imaginar tecnologias possíveis, geralmente movidas a vapor (steam, em inglês), com direito a molas, engrenagens e alavancas, no século retrasado, uma espécie de retrofuturismo. Mas vamos por partes.
Para começar, um bom ponto para conhecer este mundo é o site do Conselho Steampunk, endereço que tem o objetivo manifesto de divulgar, explicar, inspirar, homenagear e produzir cultura dentro deste gênero na forma que for: nas artes, nas vestimentas, em joias, na tecnologia. “Para tanto os idealizadores lançaram mão de conceitos sofisticados que garantissem a possibilidade de qualquer um, em qualquer lugar, independente do poder aquisitivo, idade ou qualquer outro entrave costumeiro, se visse impossibilitado de fruir a cultura Steampunk do seu jeito e sem a necessidade de aderir a qualquer organização burocrática ou centralizadora”, garante o texto de apresentação do projeto criado pelo empresário Bruno Accioly. O conceito que tem apenas dois anos já se difundiu por três estados que também criaram suas representações regionais – São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul – denominadas no jargão do Conselho de Lojas, em uma citação explícita a certa Sociedade Secreta, algo que chamou a atenção de um visitante ilustre.
“Lojas. Como lojas maçônicas? Rapaz, isto é terrivelmente século XIX.” Quem fez o comentário foi um escritor fundamental para se entender tanto o punk cibernético quanto o a vapor: Bruce Sterling, autor do romance Piratas de dados e organizador da coletânea Mirrorshades, o homem que ao lado de Willian Gibson – de Neuromancer – criou os paradigmas do cyberpunk em meados dos anos 80. O comentário saiu no dia 20 de julho, no blog que o autor americano mantém no site da Wired, a revista mais respeitada em termos de cultura tecnológica. Foi, na verdade, o segundo post em que ele falou sobre a iniciativa brasileira. Dois dias antes ele havia descoberto a página do Conselho Steampunk e brincara com a ideia, batizando o conceito de “bossa steampunk”. Na outra oportunidade, Sterling divulgou uma mensagem enviada por Bruno Accioly, dando conta das atividades do grupo no Brasil, que não se restringem a discussões virtuais, pois a Loja São Paulo, por exemplo, já organizou dois encontros em que os participantes, vestidos como nossos antepassados do século retrasado, passearam em trens a vapor naquele estado. Esta postagem, o blogueiro encerrou com a frase: “O mundo é um lugar vasto e maravilhoso, damas e cavalheiros.”
Não é um apoio qualquer que as damas e os cavalheiros do Conselho Steampunk atraíram. Como já disse, Bruce Sterling é um dos criadores da parte literária do movimento cyberpunk, mas ele e seu parceiro Willian Gibson também têm muito a ver com o steampunk como subgênero da FC. Ambos, a quatro mãos, escreveram em 1990 a obra mais representativa do início desta nova vertente. É bem verdade que já existiam livros anteriores apontando para algumas das características que seriam aprofundadas mais tarde, escritos por autores como Tim Powers e K. W. Jeter – que, aliás, foi quem cunhou o termo, três anos antes, em uma troca de cartas – mas é praticamente um consenso por parte da crítica que The Difference Engine foi o marco inicial do estilo steamer. No romance, a hipótese de partida é que o cientista e matemático inglês Charles Babbage (1791-1871) teria construído uma máquina (que chegou mesmo a projetar): o primeiro computador do mundo, baseado apenas em peças mecânicas. A invenção dá um impulso muito maior ao Império Britânico, que vivia o auge do período Vitoriano, ou seja, o tempo em que a Rainha Vitória esteve no poder, de 1837 a 1901.
Muitas das convenções do gênero estavam ali, reunidas. O período histórico definido, a tecnologia capaz de mudar tudo o que conhecemos, e até mesmo a utilização de figuras reais e apropriações de criações literárias estão presentes naquele livro. Este último item é uma tentação e tanto a todos os que se aventuram a seguir os passos de Sterling e Gibson, pois as obras escritas naqueles tempos, como os romances e os personagens mais famosos dos pais da Ficção Científica, Jules Verne, H. G. Wells, por exemplo, estão em domínio público, disponíveis para quem desejar reinterpretá-los. O uso mais radical desta característica steampunk foi feito não na literatura, mas nos quadrinhos, com a série de álbuns de A Liga Extraordinária (iniciada em 1999), do inglês Alan Moore, uma combinação de praticamente tudo o que o século XIX tem a oferecer em termos de ficção fantástica ou aventureira. Boa parte do fascínio que o gênero evoca atualmente tem como origem tais HQs escritas por Moore e ilustradas por Kevin O’Neill, que podem ter dado origem a um filme desastroso, mas continuam sendo fonte inesgotável de ideias a cada novo lançamento no papel.
Porém, quando eu escrevi que o assunto tomou a Internet não me referia apenas ao diálogo entre o Conselho Steampunk e o blog de Bruce Sterling. O tema também ganhou outros espaços na rede recentemente. Um bom exemplo é o post que a escritora e historiadora Ana Cristina Rodrigues publicou em um de seus blogs no dia 16 de julho. “Ficção a vapor” é o que chamei de verdadeira aula sobre steampunk. Com muito mais propriedade que eu neste espaço e com uma riqueza de detalhes bem maior, ela analisou todo o contexto sobre o qual acabo de escrever e teceu algumas considerações sobre o cenário nacional nesta área. Cito trechos:
Outro escritor e crítico de Ficção Científica também tratou desta pauta foi Antonio Luiz M. C. Costa. Ele publicou um longo artigo na coluna que mantém no site da revista em que trabalha a CartaCapital. Datada do dia 11 de agosto, “Steampunk, saudade ou rebeldia?” é outra contribuição para o debate, que igualmente detalhou o histórico do gênero e ponderou sobre a situação em nosso país. Citando novamente:
Os dois fizeram referência ao mesmo livro ao final de seus textos, uma coletânea que também foi destaque na seção de cultura da já citada revista CartaCapital, desta semana, chamada Steampunk – Histórias de um passado extraordinário. O livro foi lançado em São Paulo no último final de semana de julho e também participo dele com um dos nove textos. Curiosamente, apesar de não ter sido um pedido expresso da editora, a maioria dos contos longos publicados no livro tratam, sim, de aspectos históricos do Brasil e usam personagens locais entre os principais destaques de suas tramas, alguns deles citados por Ana Cristina. Neste blog, em um mesmo post podemos ler duas resenhas da obra que também ganhou destaque em um respeitado blog português dedicado ao autor Jules Verne, entre outros endereços da rede que repercutiram o lançamento. Alguns desses endereços foram reunidos por mim em um blog que criei para me ajudar a planejar a noveleta escrita para a coletânea.
E de fato ainda há mais por vir. Uma coletânea binacional, com escritores brasileiros e portugueses, está sendo organizada neste momento, com uma visão bem menos purista do gênero mas que pretende ser ainda mais focada na história destes dois países. Um romance também pode ser lançado em breve, chamado de Baronato de Shoah, de autoria de José Roberto Vieira. Fora do terreno da literatura, os quadrinhos também devem apresentar novidades com influência steampunk. O trabalho de Alexandre Lancaster com Expresso!, sua série inspirada nos mangás, pode ser acompanhado na página que o autor mantém no site DeviantART. Também inspirados nos quadrinhos japoneses, Douglas MCT e Ulisses Perez lançarão pela editora NewPop uma série com o nome Hansel&Gretel. Por último, mas não menos importante, no site dedicado a webcomics da DC, o Zuda Comics, é um brasileiro, Igor Noronha, quem desenha a HQ Sidewise que mostra as aventuras de um adolescente deslocado no tempo para um período vitoriano alternativo.
Como se vê, a agitação em torno da cultura steampunk no Brasil é grande, a ponto de chamar a atenção em outros países e dar ao leitor várias opções para participar ou ao menos experimentar esta nova versão da Revolução Industrial. O carvão queima e as engrenagens se movimentam. Boa viagem.
Para começar, um bom ponto para conhecer este mundo é o site do Conselho Steampunk, endereço que tem o objetivo manifesto de divulgar, explicar, inspirar, homenagear e produzir cultura dentro deste gênero na forma que for: nas artes, nas vestimentas, em joias, na tecnologia. “Para tanto os idealizadores lançaram mão de conceitos sofisticados que garantissem a possibilidade de qualquer um, em qualquer lugar, independente do poder aquisitivo, idade ou qualquer outro entrave costumeiro, se visse impossibilitado de fruir a cultura Steampunk do seu jeito e sem a necessidade de aderir a qualquer organização burocrática ou centralizadora”, garante o texto de apresentação do projeto criado pelo empresário Bruno Accioly. O conceito que tem apenas dois anos já se difundiu por três estados que também criaram suas representações regionais – São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul – denominadas no jargão do Conselho de Lojas, em uma citação explícita a certa Sociedade Secreta, algo que chamou a atenção de um visitante ilustre.
“Lojas. Como lojas maçônicas? Rapaz, isto é terrivelmente século XIX.” Quem fez o comentário foi um escritor fundamental para se entender tanto o punk cibernético quanto o a vapor: Bruce Sterling, autor do romance Piratas de dados e organizador da coletânea Mirrorshades, o homem que ao lado de Willian Gibson – de Neuromancer – criou os paradigmas do cyberpunk em meados dos anos 80. O comentário saiu no dia 20 de julho, no blog que o autor americano mantém no site da Wired, a revista mais respeitada em termos de cultura tecnológica. Foi, na verdade, o segundo post em que ele falou sobre a iniciativa brasileira. Dois dias antes ele havia descoberto a página do Conselho Steampunk e brincara com a ideia, batizando o conceito de “bossa steampunk”. Na outra oportunidade, Sterling divulgou uma mensagem enviada por Bruno Accioly, dando conta das atividades do grupo no Brasil, que não se restringem a discussões virtuais, pois a Loja São Paulo, por exemplo, já organizou dois encontros em que os participantes, vestidos como nossos antepassados do século retrasado, passearam em trens a vapor naquele estado. Esta postagem, o blogueiro encerrou com a frase: “O mundo é um lugar vasto e maravilhoso, damas e cavalheiros.”
Não é um apoio qualquer que as damas e os cavalheiros do Conselho Steampunk atraíram. Como já disse, Bruce Sterling é um dos criadores da parte literária do movimento cyberpunk, mas ele e seu parceiro Willian Gibson também têm muito a ver com o steampunk como subgênero da FC. Ambos, a quatro mãos, escreveram em 1990 a obra mais representativa do início desta nova vertente. É bem verdade que já existiam livros anteriores apontando para algumas das características que seriam aprofundadas mais tarde, escritos por autores como Tim Powers e K. W. Jeter – que, aliás, foi quem cunhou o termo, três anos antes, em uma troca de cartas – mas é praticamente um consenso por parte da crítica que The Difference Engine foi o marco inicial do estilo steamer. No romance, a hipótese de partida é que o cientista e matemático inglês Charles Babbage (1791-1871) teria construído uma máquina (que chegou mesmo a projetar): o primeiro computador do mundo, baseado apenas em peças mecânicas. A invenção dá um impulso muito maior ao Império Britânico, que vivia o auge do período Vitoriano, ou seja, o tempo em que a Rainha Vitória esteve no poder, de 1837 a 1901.
Muitas das convenções do gênero estavam ali, reunidas. O período histórico definido, a tecnologia capaz de mudar tudo o que conhecemos, e até mesmo a utilização de figuras reais e apropriações de criações literárias estão presentes naquele livro. Este último item é uma tentação e tanto a todos os que se aventuram a seguir os passos de Sterling e Gibson, pois as obras escritas naqueles tempos, como os romances e os personagens mais famosos dos pais da Ficção Científica, Jules Verne, H. G. Wells, por exemplo, estão em domínio público, disponíveis para quem desejar reinterpretá-los. O uso mais radical desta característica steampunk foi feito não na literatura, mas nos quadrinhos, com a série de álbuns de A Liga Extraordinária (iniciada em 1999), do inglês Alan Moore, uma combinação de praticamente tudo o que o século XIX tem a oferecer em termos de ficção fantástica ou aventureira. Boa parte do fascínio que o gênero evoca atualmente tem como origem tais HQs escritas por Moore e ilustradas por Kevin O’Neill, que podem ter dado origem a um filme desastroso, mas continuam sendo fonte inesgotável de ideias a cada novo lançamento no papel.
Porém, quando eu escrevi que o assunto tomou a Internet não me referia apenas ao diálogo entre o Conselho Steampunk e o blog de Bruce Sterling. O tema também ganhou outros espaços na rede recentemente. Um bom exemplo é o post que a escritora e historiadora Ana Cristina Rodrigues publicou em um de seus blogs no dia 16 de julho. “Ficção a vapor” é o que chamei de verdadeira aula sobre steampunk. Com muito mais propriedade que eu neste espaço e com uma riqueza de detalhes bem maior, ela analisou todo o contexto sobre o qual acabo de escrever e teceu algumas considerações sobre o cenário nacional nesta área. Cito trechos:
Agora, é de se admirar que um país que nos deu o Barão de Mauá, Augusto Zaluar, D. Pedro II, Santos Dummont… não tenha produzido obras a vapor suficientemente interessantes. Poxa, nosso imperador provavelmente foi o governante mais steampunk de sua época. Seu interesse por gadgets, ciências e novidades era/é notório.
Até esse ano, aconteceram algumas tateadas. Gerson Lodi-Ribeiro, Carlos Orsi Martinho e Octavio Aragão tangenciaram o gênero – os dois primeiros em contos, o último em seu romance, A mão que cria. Mas talvez a primeira obra consciente e declaradamente steampunk do Brasil sejam os quadrinhos de Expresso! de Alexandre Lancaster. O piloto da série foi publicado em um projeto online de curta duração, mas a saga continua, já que novas HQ’s estão previstas e um conto sobre o protagonista vai entrar na primeira coletânea nacional do gênero.
Outro escritor e crítico de Ficção Científica também tratou desta pauta foi Antonio Luiz M. C. Costa. Ele publicou um longo artigo na coluna que mantém no site da revista em que trabalha a CartaCapital. Datada do dia 11 de agosto, “Steampunk, saudade ou rebeldia?” é outra contribuição para o debate, que igualmente detalhou o histórico do gênero e ponderou sobre a situação em nosso país. Citando novamente:
É sempre bom fugir um pouco do famoso slogan de Margaret Thatcher e Francis Fukuyama, o TINA, There Is No Alternative – “Não há alternativa (ao status quo neoliberal dos anos 80 e 90)” e considerar como as coisas poderiam ser diferentes. O curioso é que, neste caso, trata-se geralmente de uma alternativa, em muitos aspectos, bem semelhante à realidade atual, com o Império Britânico e os financistas da City no papel dos EUA e de Wall Street.
Pode reforçar a ideia de que as roupas e maneiras podem mudar, mas a essência da sociedade foi e sempre será a mesma. Como também pode funcionar como alegoria ou caricatura de problemas atuais e mostrar o que têm de histórico e contingente, como dependem de desenvolvimentos específicos e podem vir a ser superados. É um campo no qual concepções opostas podem se expressar em um ambiente fantástico e de sabor nostálgico, mas ainda assim com uma relação bem clara com a realidade social, política e ambiental do século XXI.
O pleno desenvolvimento dessas possibilidades no Brasil depende, porém, de que o Steampunk não seja apenas consumido como moda ou como decoração de animês e aventuras hollywoodianas. Para ser criativo, precisa ser produzido e discutido como um subgênero literário e associado ao ponto de vista brasileiro ou à história (real e imaginada) de nosso país. Por enquanto, conta-se apenas com a recém-lançada antologia de contos Steampunk, da Tarja (R$ 39, 184 páginas), que inclui uma colaboração do autor desta coluna. Uma segunda antologia, a ser intitulada Vaporpunk, está sendo organizada pelo escritor Gerson Lodi-Ribeiro e é esperada para breve. Teremos então uma boa ideia de como se imagina, em terras tropicais, essa história paralela.
Os dois fizeram referência ao mesmo livro ao final de seus textos, uma coletânea que também foi destaque na seção de cultura da já citada revista CartaCapital, desta semana, chamada Steampunk – Histórias de um passado extraordinário. O livro foi lançado em São Paulo no último final de semana de julho e também participo dele com um dos nove textos. Curiosamente, apesar de não ter sido um pedido expresso da editora, a maioria dos contos longos publicados no livro tratam, sim, de aspectos históricos do Brasil e usam personagens locais entre os principais destaques de suas tramas, alguns deles citados por Ana Cristina. Neste blog, em um mesmo post podemos ler duas resenhas da obra que também ganhou destaque em um respeitado blog português dedicado ao autor Jules Verne, entre outros endereços da rede que repercutiram o lançamento. Alguns desses endereços foram reunidos por mim em um blog que criei para me ajudar a planejar a noveleta escrita para a coletânea.
E de fato ainda há mais por vir. Uma coletânea binacional, com escritores brasileiros e portugueses, está sendo organizada neste momento, com uma visão bem menos purista do gênero mas que pretende ser ainda mais focada na história destes dois países. Um romance também pode ser lançado em breve, chamado de Baronato de Shoah, de autoria de José Roberto Vieira. Fora do terreno da literatura, os quadrinhos também devem apresentar novidades com influência steampunk. O trabalho de Alexandre Lancaster com Expresso!, sua série inspirada nos mangás, pode ser acompanhado na página que o autor mantém no site DeviantART. Também inspirados nos quadrinhos japoneses, Douglas MCT e Ulisses Perez lançarão pela editora NewPop uma série com o nome Hansel&Gretel. Por último, mas não menos importante, no site dedicado a webcomics da DC, o Zuda Comics, é um brasileiro, Igor Noronha, quem desenha a HQ Sidewise que mostra as aventuras de um adolescente deslocado no tempo para um período vitoriano alternativo.
Como se vê, a agitação em torno da cultura steampunk no Brasil é grande, a ponto de chamar a atenção em outros países e dar ao leitor várias opções para participar ou ao menos experimentar esta nova versão da Revolução Industrial. O carvão queima e as engrenagens se movimentam. Boa viagem.
quarta-feira, 22 de julho de 2009
Catecismos científicos
Quando chegou à minha caixa de correspondência o mais recente livro de Carlos Orsi não pude deixar de pensar nos catecismos pornográficos que Alcides Caminha assinava com o pseudônimo Carlos Zéfiro durante a década de 60 no Rio de Janeiro. O saudosismo foi despertado pela forma como foi produzida a novela O que o olho vê, pela Scarium, editora mantida pelo carioca Marco Bourguingnon. Responsável pela mais longeva publicação em papel dedicada à ficção fantástica no país – um zine com o mesmo nome da editora por onde já publicaram os melhores escritores de ficção científica, horror e fantasia brasileiros que já está indo para a edição de número 26, com chamada para submissão de contos de FC – a empresa mantém sua loja virtual desde 2002. Mesmo com esse pé na tecnologia, não perde o status artesanal de seus impressos, como os livros de sua coleção Scarium Fantástica, da qual a nova obra do jundiaiense que já foi assunto do Overmundo por três vezes – primeira, segunda e terceira – é o terceiro volume.
Editada em um formato de bolso, com 13 cm por 18,5 cm, 48 páginas, encadernação grampeada e a capa, monocromática roxa, colada por cima, a novela tem o charme das primeiras publicações do gênero, na época pioneira das pulp magazine. Só faltou o papel já vir amarelado para dar ainda mais o clima de folhetim, que já começa com a citação escolhida pelo autor, de Iam Fleming, no original, na língua de James Bond: “Nunca mande um homem quando puder mandar uma bala”. Uma citação muito adequada, já que a trama é também de espionagem e de intriga internacional. Mas se fosse apenas isso que fizesse parte da receita, O que o olho vê não seria uma representante da literatura fantástica. O que a insere nesta vertente é que a novela também é uma ótima história alternativa, subgênero dos mais respeitados da ficção científica.
A história alternativa, ou HA, é um meio furtivo de levar a ficção científica a quem tem reservas com o meio. Mesmo editoras que são declaradamente restritivas à FC já publicaram este gênero que faz especulações com a História e, portanto, é, sim, conceitualmente, ficção científica. Caso da Cia. das Letras que durante muito tempo informou em sua página na Internet que não aceitava receber originais deste ramo da literatura. Felizmente, tal decisão editorial não a impediu de publicar os excelentes livros Associação Judaica de Polícia – no qual o consagrado Michael Chabon especula um mundo em que Israel foi varrido do mapa e os EUA cedem o Alasca provisoriamente como lar para os judeus do mundo –, ou Complô contra a América – do ainda mais consagrado Philip Roth, que com falsas memórias de sua infância imagina um pró-nazista Charles Lindbergh chegando à presidência dos Estados Unidos nos beligerantes anos 40.
Editoras voltadas ao gênero também lançaram sua cota de HA, como a Aleph que republicou no Brasil a obra de outro Philp, o K. Dick, autor de um dos primeiros e mais famosos romances do gênero, O homem do Castelo Alto, no qual, sempre consultando o oráculo do I Ching, escreveu sobre um mundo no qual os países do Eixo venceram a II Guerra Mundial, o que levou alemães e japoneses a dividirem o território americano entre si. Mesmo assim, o maior astro do gênero, Harry Turtledove, ainda não é muito conhecido no Brasil, mas conta com tradução para nossa língua ao menos em Portugal, onde foi lançado recentemente, pela editora Saída de Emergência, O dilema de Shakespeare, livro robusto no qual o dramaturgo é convocado a escrever uma peça que sirva de inspiração à resistência dos ingleses que tiveram seu país dominado pela Espanha católica e inquisitorial do rei Filipe e sua Armada Invencível.
O Brasil não é apenas consumidor, mas também produz história alternativa. O maior incentivador e um dos pioneiros no gênero em nosso país é o carioca Gerson Lodi-Ribeiro. Apesar de o veterano J. J. Veiga ter escrito antes uma história em que Antonio Conselheiro sobrevivera ao cerco de Canudos, é uma noveleta de Lodi-Ribeiro a mais citada como precursora das HAs em nosso país. “A ética da traição”, publicada na Isac Asimov Magazine brasileira, falava de um Brasil que havia perdido a Guerra do Paraguai, mas, em compensação, se tornara um país mais desenvolvido. Este texto e outros de uma segunda linha de especulação do autor, na qual os holandeses não foram expulsos, mas se aliaram aos quilombolas e se mantiveram em Recife, foram compilados em forma de livro: Outros Brasis, da Mercuryo, em 2006. Antes disso, quando se comemoravam os 500 anos da descoberta do Brasil, ele já havia organizado uma coletânea inteira do gênero, chamada Phantastica Brasiliana, pela editora Ano-Luz, da qual participou Carlos Orsi, como coeditor e um dos autores.
Após o intervalo explicativo, vamos voltar a O que o olho vê. Esta novela de Carlos Orsi já estava escrita há tempos, foi concluída logo após sua participação em Phantastica Brasiliana, portanto, antes dos atentados de 11 de Setembro e muito antes desta pandemia de gripe suína que preocupa o mundo. Tudo isso torna ainda mais saborosa a sinopse com que o editor Marco Bourguingnon descreve o livro: “Um estudante brasileiro de Cosmologia vivendo nos Estados Unidos da América, ou melhor, nos Estados Cristãos da América, acaba se envolvendo em uma emaranhada trama de espionagem internacional. Ele parte para uma missão importante, recuperar os códigos do vírus da gripe suína escondido artificialmente dentro de um olho.”
Este é um bom resumo da trama, narrada em primeira pessoa pelo brasileiro que nunca tem seu verdadeiro nome revelado. O que torna o livro uma história alternativa é uma diferença básica entre aquela linha do tempo e a nossa, algo que no jargão do meio é chamado de ponto de divergência. No universo elaborado por Orsi, os Estados Unidos foram atingidos por uma epidemia de gripe tão forte em 1915 que o país se viu impedido de entrar no que seria a Primeira Guerra Mundial para auxiliar a Inglaterra. Sem essa participação, o Império Britânico caiu, o mundo islâmico de alguma forma se tornou o maior produtor de tecnologia e quanto aos EUA... Como escreveu Bourguingnon eles se tornaram uma república fundamentalista e substituíram o United por Christian, em apenas um exemplo das diferenças entre este mundo e o nosso. Parte da brincadeira é ver o novo significado de siglas como MIT ou da expressão que substitui a nossa conhecida Cortina de Ferro. Fora as apropriações bíblicas e do Alcorão para explicar termos científicos da cosmologia, como a explicação para a radiação de fundo ou o novo nome do Big Bem, os melhores achados do livro, verdadeiros exemplos de catecismos científicos propriamente ditos.
É curioso que o autor tenha se contido para evitar falar mais, detalhar, exemplificar mostrar mais exemplos dessas novas sociedades imaginadas por ele. Como ficou, O que o lho vê é uma ótima novela, evocando conceitos de inteligência artificial, nanotecnologia, fisiologia humana, física de partículas entre outros temas que o autor, jornalista especializado em divulgação científica, sabe lidar como ninguém no Brasil. Mas dá o que pensar no que poderia ser um romance sobre este mundo em que a guerra fria se mistura à guerra santa dando origem a um mundo ao mesmo tempo novo e tão reconhecível. Resta torcer para que Carlos Orsi volte ao tema e aprofunde os detalhes dos quais só nos deixou espiar a superfície. A impressão é de que é possível trazer muito mais à tona.
E nesses tempos de crise e de vários lançamentos imperdíveis para quem acompanha a FC nacional (dê uma olhada na lista compilada por Fernando Trevisan em seu blog) uma ótima notícia é o preço deste lançamento. Na loja virtual da Scarium, a novela pode ser adquirida de qualquer parte do país por apenas oito reais. Não se pense que pelo preço ou pela produção artesanal vai se estar levando um produto mal-acabado. Apesar de a proposta de capa não ter me agradado e muito pouco ter a ver com o conteúdo da obra – há algo vagamente citado bem ao final do livro – esta novela está muito bem produzida e com um índice de erros de revisão aceitável mesmo se comparado ao de editoras maiores. Além de alguma confusão com o uso de itálico para diferenciar a fala do narrador da de uma inteligência artificial presente na história, percebi apenas cinco deslizes. Na página 18, aparece “tranaformá-la” no lugar de “transformá-la”; na 26, “quer” no lugar de “que” e “quatro” no de “quarto”; na 33, “batias” no lugar de “batia”; e a repetição da palavra “dentro”, na 36. Ou seja, o catecismo científico da Scarium é tão bom e barato e satisfaz tanto quanto os do Carlos Zéfiro.
Editada em um formato de bolso, com 13 cm por 18,5 cm, 48 páginas, encadernação grampeada e a capa, monocromática roxa, colada por cima, a novela tem o charme das primeiras publicações do gênero, na época pioneira das pulp magazine. Só faltou o papel já vir amarelado para dar ainda mais o clima de folhetim, que já começa com a citação escolhida pelo autor, de Iam Fleming, no original, na língua de James Bond: “Nunca mande um homem quando puder mandar uma bala”. Uma citação muito adequada, já que a trama é também de espionagem e de intriga internacional. Mas se fosse apenas isso que fizesse parte da receita, O que o olho vê não seria uma representante da literatura fantástica. O que a insere nesta vertente é que a novela também é uma ótima história alternativa, subgênero dos mais respeitados da ficção científica.
A história alternativa, ou HA, é um meio furtivo de levar a ficção científica a quem tem reservas com o meio. Mesmo editoras que são declaradamente restritivas à FC já publicaram este gênero que faz especulações com a História e, portanto, é, sim, conceitualmente, ficção científica. Caso da Cia. das Letras que durante muito tempo informou em sua página na Internet que não aceitava receber originais deste ramo da literatura. Felizmente, tal decisão editorial não a impediu de publicar os excelentes livros Associação Judaica de Polícia – no qual o consagrado Michael Chabon especula um mundo em que Israel foi varrido do mapa e os EUA cedem o Alasca provisoriamente como lar para os judeus do mundo –, ou Complô contra a América – do ainda mais consagrado Philip Roth, que com falsas memórias de sua infância imagina um pró-nazista Charles Lindbergh chegando à presidência dos Estados Unidos nos beligerantes anos 40.
Editoras voltadas ao gênero também lançaram sua cota de HA, como a Aleph que republicou no Brasil a obra de outro Philp, o K. Dick, autor de um dos primeiros e mais famosos romances do gênero, O homem do Castelo Alto, no qual, sempre consultando o oráculo do I Ching, escreveu sobre um mundo no qual os países do Eixo venceram a II Guerra Mundial, o que levou alemães e japoneses a dividirem o território americano entre si. Mesmo assim, o maior astro do gênero, Harry Turtledove, ainda não é muito conhecido no Brasil, mas conta com tradução para nossa língua ao menos em Portugal, onde foi lançado recentemente, pela editora Saída de Emergência, O dilema de Shakespeare, livro robusto no qual o dramaturgo é convocado a escrever uma peça que sirva de inspiração à resistência dos ingleses que tiveram seu país dominado pela Espanha católica e inquisitorial do rei Filipe e sua Armada Invencível.
O Brasil não é apenas consumidor, mas também produz história alternativa. O maior incentivador e um dos pioneiros no gênero em nosso país é o carioca Gerson Lodi-Ribeiro. Apesar de o veterano J. J. Veiga ter escrito antes uma história em que Antonio Conselheiro sobrevivera ao cerco de Canudos, é uma noveleta de Lodi-Ribeiro a mais citada como precursora das HAs em nosso país. “A ética da traição”, publicada na Isac Asimov Magazine brasileira, falava de um Brasil que havia perdido a Guerra do Paraguai, mas, em compensação, se tornara um país mais desenvolvido. Este texto e outros de uma segunda linha de especulação do autor, na qual os holandeses não foram expulsos, mas se aliaram aos quilombolas e se mantiveram em Recife, foram compilados em forma de livro: Outros Brasis, da Mercuryo, em 2006. Antes disso, quando se comemoravam os 500 anos da descoberta do Brasil, ele já havia organizado uma coletânea inteira do gênero, chamada Phantastica Brasiliana, pela editora Ano-Luz, da qual participou Carlos Orsi, como coeditor e um dos autores.
Após o intervalo explicativo, vamos voltar a O que o olho vê. Esta novela de Carlos Orsi já estava escrita há tempos, foi concluída logo após sua participação em Phantastica Brasiliana, portanto, antes dos atentados de 11 de Setembro e muito antes desta pandemia de gripe suína que preocupa o mundo. Tudo isso torna ainda mais saborosa a sinopse com que o editor Marco Bourguingnon descreve o livro: “Um estudante brasileiro de Cosmologia vivendo nos Estados Unidos da América, ou melhor, nos Estados Cristãos da América, acaba se envolvendo em uma emaranhada trama de espionagem internacional. Ele parte para uma missão importante, recuperar os códigos do vírus da gripe suína escondido artificialmente dentro de um olho.”
Este é um bom resumo da trama, narrada em primeira pessoa pelo brasileiro que nunca tem seu verdadeiro nome revelado. O que torna o livro uma história alternativa é uma diferença básica entre aquela linha do tempo e a nossa, algo que no jargão do meio é chamado de ponto de divergência. No universo elaborado por Orsi, os Estados Unidos foram atingidos por uma epidemia de gripe tão forte em 1915 que o país se viu impedido de entrar no que seria a Primeira Guerra Mundial para auxiliar a Inglaterra. Sem essa participação, o Império Britânico caiu, o mundo islâmico de alguma forma se tornou o maior produtor de tecnologia e quanto aos EUA... Como escreveu Bourguingnon eles se tornaram uma república fundamentalista e substituíram o United por Christian, em apenas um exemplo das diferenças entre este mundo e o nosso. Parte da brincadeira é ver o novo significado de siglas como MIT ou da expressão que substitui a nossa conhecida Cortina de Ferro. Fora as apropriações bíblicas e do Alcorão para explicar termos científicos da cosmologia, como a explicação para a radiação de fundo ou o novo nome do Big Bem, os melhores achados do livro, verdadeiros exemplos de catecismos científicos propriamente ditos.
É curioso que o autor tenha se contido para evitar falar mais, detalhar, exemplificar mostrar mais exemplos dessas novas sociedades imaginadas por ele. Como ficou, O que o lho vê é uma ótima novela, evocando conceitos de inteligência artificial, nanotecnologia, fisiologia humana, física de partículas entre outros temas que o autor, jornalista especializado em divulgação científica, sabe lidar como ninguém no Brasil. Mas dá o que pensar no que poderia ser um romance sobre este mundo em que a guerra fria se mistura à guerra santa dando origem a um mundo ao mesmo tempo novo e tão reconhecível. Resta torcer para que Carlos Orsi volte ao tema e aprofunde os detalhes dos quais só nos deixou espiar a superfície. A impressão é de que é possível trazer muito mais à tona.
E nesses tempos de crise e de vários lançamentos imperdíveis para quem acompanha a FC nacional (dê uma olhada na lista compilada por Fernando Trevisan em seu blog) uma ótima notícia é o preço deste lançamento. Na loja virtual da Scarium, a novela pode ser adquirida de qualquer parte do país por apenas oito reais. Não se pense que pelo preço ou pela produção artesanal vai se estar levando um produto mal-acabado. Apesar de a proposta de capa não ter me agradado e muito pouco ter a ver com o conteúdo da obra – há algo vagamente citado bem ao final do livro – esta novela está muito bem produzida e com um índice de erros de revisão aceitável mesmo se comparado ao de editoras maiores. Além de alguma confusão com o uso de itálico para diferenciar a fala do narrador da de uma inteligência artificial presente na história, percebi apenas cinco deslizes. Na página 18, aparece “tranaformá-la” no lugar de “transformá-la”; na 26, “quer” no lugar de “que” e “quatro” no de “quarto”; na 33, “batias” no lugar de “batia”; e a repetição da palavra “dentro”, na 36. Ou seja, o catecismo científico da Scarium é tão bom e barato e satisfaz tanto quanto os do Carlos Zéfiro.
sábado, 2 de maio de 2009
Sobrevivência nas selvas
Quando anunciei em meu blog a publicação de um novo romance de Carlos Orsi disse que aquela seria uma ótima e uma má notícia para quem lê ficção científica no Brasil. Eu estava especulando ainda, pois havia acabado de receber o email do autor avisando que ele utilizara o Scribd para divulgar o e-book Nômade – Uma narrativa da grande viagem. Mas era uma especulação com base sólida, pois esse jornalista paulista, de Jundiaí, é o escritor de ficção fantástica nacional do qual mais li textos com a particularidade de que gostei de todos. Já havia resenhado um livro dele e o entrevistado, aqui mesmo, para o Overmundo e publiquei três contos de sua autoria naquele meu já citado blog entre os 60 textos disponíveis lá de várias vertentes da literatura de gênero: ficção científica, fantasia, horror, policial, detetive, história alternativa, ficção alternativa, contos filosóficos. Era grande a probabilidade de eu gostar deste novo romance, portanto.
E eu não me enganei. Li o e-book de 106 páginas no mesmo dia, naquela véspera de feriado. Já sabia que era uma história focada num tema clássico da FC: a idéia de uma nave geracional, ou seja, uma espaçonave preparada para atravessar uma distância tão longa que o percurso consumiria o espaço de gerações de seus tripulantes. Segundo os pesquisadores do gênero, o primeiro a pensar no assunto não foi um ficcionista, mas o ensaísta russo Konstantin Tsiolkovsky, em 1926. Nos mais de 80 anos que se passaram, muitos escritores aproveitaram o conceito, destaco Tau Zero do americano Poul Anderson, publicado na forma de livro em 1970, com a trágica história dos tripulantes de Leonora Christine. No caso do ebook nacional, a nave leva o mesmo nome da obra, Nômade, e a grande viagem leva pouco mais de 200 anos para percorrer a distância que vai levar sua tripulação da Terra a seu novo lar.
Uma outra diferença das duas obras, é que o livro americano é uma referência no estilo hard, o tipo de FC que segue mais minuciosamente ciência e tecnologia plausíveis, extrapolando dentro de limites mais, neste contexto, realistas. Apesar de Carlos Orsi ser reconhecidamente um dos três brasileiros de maior destaque neste mesmo estilo, para seu romance ele enfatizou uma outra abordagem, Nômade é uma legítima obra voltada para o público juvenil. E isso é ótimo, a FC às vezes sofre tanto com o estigma de ser uma literatura inferior que muitos autores tentam dar tamanha densidade a seus textos, evocar tal sorte de experimentalismos formais que o prazer da leitura, o arrebatamento do sense of wonder acaba sendo sacrificado. Para uma profunda discussão sobre a vocação juvenil do gênero, recomendo este blog feito a quatro mãos.
E o ebook nacional consegue o feito de sustentar o senso de maravilhamento sem deixar de lado a apuração técnica típica do autor, jornalista especializado em divulgação científica. Provando que escrever para adolescentes não é e nunca foi sinônimo de textos mal pesquisados e implausíveis, muito menos de tratados didáticos sem sabor, o jundiaiense encontrou um equilíbrio excelente para sua narrativa. Nem os detalhes relacionados a sobrevivência na selva, ambientes de gravidade zero ou sobre efeitos de ótica, nem o ritmo de aventura, ganchos narrativos entre os capítulos e a construção de personagens foram desprezados. O autor deu tanta atenção ao lado científico quanto ao juvenil de sua ficção e se saiu muito bem em ambos.
Apesar das poucas páginas, nós, leitores, passamos por uma impressionante variedade de ambientações neste breve romance. Tudo começa com uma selva aparentemente normal, onde se encontram os principais personagens do livro, um grupo de adolescentes com idade aproximada de 15 anos. Logo percebemos que aquele é um cenário artificial, construído no interior da tal nave com o objetivo de treinar a ala jovem da tripulação, em uma espécie de acampamento, para enfrentar qualquer eventualidade no novo planeta para onde são transportados. Não demora para uma série de incidentes, gradativamente mais perigosos, deixar claro que algo de errado acontece no mundo tecnológico que envolve aquele pequeno oásis artificial. O casal de protagonistas, Peleu e Helena, são escalados para tentar descobrir o que está havendo, o porquê de eles não conseguirem mais se comunicar com os adultos ou mesmo com Nestor, a inteligência artificial que comanda a nave Nômade.
A trama de Orsi segue esse caminho clássico, com os dois jovens enfrentando várias dificuldades; demonstrando que o conhecimento de um, completa o do outro; e o consequente amadurecimento que essa jornada provoca em ambos. Assim como a própria temática da nave geracional, o escritor trabalha com elementos bastante conhecidos ao longo das páginas, mas mesmo assim consegue tirar o melhor da história que está contando. Talvez ele pudesse ter elaborado um tanto mais o clímax do livro, que tem uma resolução simples e não tão satisfatória ou plausível quanto todo o restante do desenvolvimento da aventura, mesmo assim, é um belo livro. Faz pensar nas possibilidades que teria se chegasse a um grande público que começa a descobrir o gosto pela leitura e outras formas de adaptar seu roteiro para mídias como quadrinhos, jogos ou animações.
Então, dito tudo isso, se o livro é tão bom ou ainda melhor que o esperado, por que haveria um lado mau na notícia de sua publicação, ainda mais da forma que se deu, de graça, à disposição de todos os interessados? Parte da resposta está na pergunta. Mas a resposta inteira está no posfácio que o próprio autor escreveu “Nota à edição free ebook – ou, por que este livro está aqui”. No pósfácio-nota-desabafo, Carlos Orsi faz uma narrativa tão cheia de desventuras quanto a outra, a da parte fictícia do livro. Mesmo sem citar nomes das pessoas e empresas envolvidas (e eu opto aqui por não especular, até para evitar a fulanização de um debate que deve mesmo ser mais abrangente), ele demonstra que a sobrevivência na selva ou no espaço pode ser mais simples que no mercado editorial brasileiro. Reproduzo o texto abaixo, na íntegra, desejando que algum dia esta realidade pouco hospitaleira mude.
Nota à edição free ebook – ou, por que este livro está aqui
Nômade tem uma história engraçada: o livro nasceu de uma encomenda estilo “contrato de risco” de uma importante editora do ramo de livros juvenis. Basicamente, perguntaram-me se eu topava escrever um romance para jovens sem compromisso, submeter a eles e, se gostassem, o livro saía.
Resumindo: escrevi. Submeti. Gostaram mais ou menos. Reescrevi. Gostaram pra valer. Não saiu.
Por quê? Não faço a menor idéia. O que sei é que passei a maior parte da presente década esperando que alguém na tal editora batesse o martelo, me apresentasse um contrato, fizesse alguma coisa. Depois de tanto tempo, até uma rejeição, tipo, “desculpe, mas o funcionário que deu aprovação inicial a seu livro foi diagnosticado com esquizofrenia, jamais publicaríamos um lixo desses”, teria sido bem-vinda.
Mas, bolas, para quê tratar escritores com cortesia e consideração, não é mesmo? Eles se vendem por aí, como diz o provérbio americano, por dez centavos a dúzia.
Então, o que pretendo ao lançar Nômade como um livro eletrônico grátis? Eu poderia responder dizendo que faço isso para exorcizar o fetiche do papel, que este livro representa meu grito de liberdade em relação às velhas mídias ultrapassadas que dependem de tinta e árvores mortas para subsistir.
Mas estaria mentindo.
Meu objetivo secreto, com este livro, é fazer tanto sucesso, mas tanto sucesso, que seja lá quem for o gênio que bloqueou a publicação lá naquela editora termine seus dias em desonra, opróbio e ostracismo, passando frio e fome e vendendo DVDs piratas na Praça da Sé.
Como conseguir o objetivo secreto é um pouco difícil, reconheço, meu objetivo expresso é, simplesmente, completar o parto iniciado tantos anos atrás. Cada escritor tem seu jeito, suponho, mas eu sou um maníaco da publicação: saber que tenho um texto acabado na gaveta é algo que me dói quase tanto quanto ter uma batata quente nas mãos.
Nestes quase 18 anos como escritor profissional (recebi meu primeiro cheque por uma obra de ficção em 1992) uma coisa que aprendi é que sou um péssimo vendedor: não adianta eu bancar uma tiragem e pôr a banquinha na rua, o livro vai encalhar, independentemente de seus méritos. A incapacidade psicológica de pedir dinheiro aos outros é um dos fantasmas que assombram minha vida.
Então, por que não simplesmente soltar o livro no mundo? Prece ser a solução lógica.
Outra coisa que aprendi nestes 18 anos é que os textos têm um jeito de achar seus próprios caminhos. Dia desses, dando uma busca por meus próprios títulos no Google (narcisista! narcisista!) achei o blog de uma menina que cita minha primeira coletânea de contos, Medo, Mistério e Morte, como um de seus livros favoritos. Essa moça provavelmente nem tinha nascido quando os primeiros contos daquele livro foram escritos.
Então, aqui está Nômade. Talvez um dia ele venha a ser o livro favorito de alguém que não nasceu ainda.
Não é um castelo na França, uma vaga na Academia ou um fim de semana na Ilha de Caras, mas acho que dá para o gasto.
E eu não me enganei. Li o e-book de 106 páginas no mesmo dia, naquela véspera de feriado. Já sabia que era uma história focada num tema clássico da FC: a idéia de uma nave geracional, ou seja, uma espaçonave preparada para atravessar uma distância tão longa que o percurso consumiria o espaço de gerações de seus tripulantes. Segundo os pesquisadores do gênero, o primeiro a pensar no assunto não foi um ficcionista, mas o ensaísta russo Konstantin Tsiolkovsky, em 1926. Nos mais de 80 anos que se passaram, muitos escritores aproveitaram o conceito, destaco Tau Zero do americano Poul Anderson, publicado na forma de livro em 1970, com a trágica história dos tripulantes de Leonora Christine. No caso do ebook nacional, a nave leva o mesmo nome da obra, Nômade, e a grande viagem leva pouco mais de 200 anos para percorrer a distância que vai levar sua tripulação da Terra a seu novo lar.
Uma outra diferença das duas obras, é que o livro americano é uma referência no estilo hard, o tipo de FC que segue mais minuciosamente ciência e tecnologia plausíveis, extrapolando dentro de limites mais, neste contexto, realistas. Apesar de Carlos Orsi ser reconhecidamente um dos três brasileiros de maior destaque neste mesmo estilo, para seu romance ele enfatizou uma outra abordagem, Nômade é uma legítima obra voltada para o público juvenil. E isso é ótimo, a FC às vezes sofre tanto com o estigma de ser uma literatura inferior que muitos autores tentam dar tamanha densidade a seus textos, evocar tal sorte de experimentalismos formais que o prazer da leitura, o arrebatamento do sense of wonder acaba sendo sacrificado. Para uma profunda discussão sobre a vocação juvenil do gênero, recomendo este blog feito a quatro mãos.
E o ebook nacional consegue o feito de sustentar o senso de maravilhamento sem deixar de lado a apuração técnica típica do autor, jornalista especializado em divulgação científica. Provando que escrever para adolescentes não é e nunca foi sinônimo de textos mal pesquisados e implausíveis, muito menos de tratados didáticos sem sabor, o jundiaiense encontrou um equilíbrio excelente para sua narrativa. Nem os detalhes relacionados a sobrevivência na selva, ambientes de gravidade zero ou sobre efeitos de ótica, nem o ritmo de aventura, ganchos narrativos entre os capítulos e a construção de personagens foram desprezados. O autor deu tanta atenção ao lado científico quanto ao juvenil de sua ficção e se saiu muito bem em ambos.
Apesar das poucas páginas, nós, leitores, passamos por uma impressionante variedade de ambientações neste breve romance. Tudo começa com uma selva aparentemente normal, onde se encontram os principais personagens do livro, um grupo de adolescentes com idade aproximada de 15 anos. Logo percebemos que aquele é um cenário artificial, construído no interior da tal nave com o objetivo de treinar a ala jovem da tripulação, em uma espécie de acampamento, para enfrentar qualquer eventualidade no novo planeta para onde são transportados. Não demora para uma série de incidentes, gradativamente mais perigosos, deixar claro que algo de errado acontece no mundo tecnológico que envolve aquele pequeno oásis artificial. O casal de protagonistas, Peleu e Helena, são escalados para tentar descobrir o que está havendo, o porquê de eles não conseguirem mais se comunicar com os adultos ou mesmo com Nestor, a inteligência artificial que comanda a nave Nômade.
A trama de Orsi segue esse caminho clássico, com os dois jovens enfrentando várias dificuldades; demonstrando que o conhecimento de um, completa o do outro; e o consequente amadurecimento que essa jornada provoca em ambos. Assim como a própria temática da nave geracional, o escritor trabalha com elementos bastante conhecidos ao longo das páginas, mas mesmo assim consegue tirar o melhor da história que está contando. Talvez ele pudesse ter elaborado um tanto mais o clímax do livro, que tem uma resolução simples e não tão satisfatória ou plausível quanto todo o restante do desenvolvimento da aventura, mesmo assim, é um belo livro. Faz pensar nas possibilidades que teria se chegasse a um grande público que começa a descobrir o gosto pela leitura e outras formas de adaptar seu roteiro para mídias como quadrinhos, jogos ou animações.
Então, dito tudo isso, se o livro é tão bom ou ainda melhor que o esperado, por que haveria um lado mau na notícia de sua publicação, ainda mais da forma que se deu, de graça, à disposição de todos os interessados? Parte da resposta está na pergunta. Mas a resposta inteira está no posfácio que o próprio autor escreveu “Nota à edição free ebook – ou, por que este livro está aqui”. No pósfácio-nota-desabafo, Carlos Orsi faz uma narrativa tão cheia de desventuras quanto a outra, a da parte fictícia do livro. Mesmo sem citar nomes das pessoas e empresas envolvidas (e eu opto aqui por não especular, até para evitar a fulanização de um debate que deve mesmo ser mais abrangente), ele demonstra que a sobrevivência na selva ou no espaço pode ser mais simples que no mercado editorial brasileiro. Reproduzo o texto abaixo, na íntegra, desejando que algum dia esta realidade pouco hospitaleira mude.
Nota à edição free ebook – ou, por que este livro está aqui
Nômade tem uma história engraçada: o livro nasceu de uma encomenda estilo “contrato de risco” de uma importante editora do ramo de livros juvenis. Basicamente, perguntaram-me se eu topava escrever um romance para jovens sem compromisso, submeter a eles e, se gostassem, o livro saía.
Resumindo: escrevi. Submeti. Gostaram mais ou menos. Reescrevi. Gostaram pra valer. Não saiu.
Por quê? Não faço a menor idéia. O que sei é que passei a maior parte da presente década esperando que alguém na tal editora batesse o martelo, me apresentasse um contrato, fizesse alguma coisa. Depois de tanto tempo, até uma rejeição, tipo, “desculpe, mas o funcionário que deu aprovação inicial a seu livro foi diagnosticado com esquizofrenia, jamais publicaríamos um lixo desses”, teria sido bem-vinda.
Mas, bolas, para quê tratar escritores com cortesia e consideração, não é mesmo? Eles se vendem por aí, como diz o provérbio americano, por dez centavos a dúzia.
Então, o que pretendo ao lançar Nômade como um livro eletrônico grátis? Eu poderia responder dizendo que faço isso para exorcizar o fetiche do papel, que este livro representa meu grito de liberdade em relação às velhas mídias ultrapassadas que dependem de tinta e árvores mortas para subsistir.
Mas estaria mentindo.
Meu objetivo secreto, com este livro, é fazer tanto sucesso, mas tanto sucesso, que seja lá quem for o gênio que bloqueou a publicação lá naquela editora termine seus dias em desonra, opróbio e ostracismo, passando frio e fome e vendendo DVDs piratas na Praça da Sé.
Como conseguir o objetivo secreto é um pouco difícil, reconheço, meu objetivo expresso é, simplesmente, completar o parto iniciado tantos anos atrás. Cada escritor tem seu jeito, suponho, mas eu sou um maníaco da publicação: saber que tenho um texto acabado na gaveta é algo que me dói quase tanto quanto ter uma batata quente nas mãos.
Nestes quase 18 anos como escritor profissional (recebi meu primeiro cheque por uma obra de ficção em 1992) uma coisa que aprendi é que sou um péssimo vendedor: não adianta eu bancar uma tiragem e pôr a banquinha na rua, o livro vai encalhar, independentemente de seus méritos. A incapacidade psicológica de pedir dinheiro aos outros é um dos fantasmas que assombram minha vida.
Então, por que não simplesmente soltar o livro no mundo? Prece ser a solução lógica.
Outra coisa que aprendi nestes 18 anos é que os textos têm um jeito de achar seus próprios caminhos. Dia desses, dando uma busca por meus próprios títulos no Google (narcisista! narcisista!) achei o blog de uma menina que cita minha primeira coletânea de contos, Medo, Mistério e Morte, como um de seus livros favoritos. Essa moça provavelmente nem tinha nascido quando os primeiros contos daquele livro foram escritos.
Então, aqui está Nômade. Talvez um dia ele venha a ser o livro favorito de alguém que não nasceu ainda.
Não é um castelo na França, uma vaga na Academia ou um fim de semana na Ilha de Caras, mas acho que dá para o gasto.
quinta-feira, 15 de janeiro de 2009
Criação coletiva
Com o romance escrito por ele, um projeto multimídia deu oficialmente a largada em uma invasão que ocorrerá na vida de quem consome games, quadrinhos e livros com temáticas ligadas à ficção científica. Taikodom: Despertar é o segundo livro deste game designer carioca, com formação de historiador, e deve apresentar a leitores brasileiros e portugueses uma inciativa nacional que já consumiu investimentos da ordem de R$ 15 milhões. Na entrevista a seguir, ele fala sobre a responsabilidade que teve em mãos, no processo de criação verdadeiramente coletiva que game e romance compartilharam e sobre o que o futuro reserva ao Taikodom, ou Domínio do Espaço, o primeiro Massive Social Game do mundo. Com vocês, o especialista em space opera deste quadrante do espaço, João Marcelo Beraldo.
Antes do lançamento de Taikodom: Despertar e de ser contratado como game designer pela empresa responsável pelo projeto, a Hoplon, você já tinha experiência tanto literária quanto com jogos, certo? Poderia falar um pouco sobre seus livros, impresso e on-line, anteriores e sobre outros games com que trabalhou?
Bom, meu primeiro livro impresso foi Véu da verdade, uma ficção Space Opera em um universo próprio. A proposta dele era criar um universo ficcional com estilo próprio, com um jeitinho brasileiro, e com espaço o suficiente para vários tipos de história não necessariamente interligadas. O Véu foi a primeira, mas longe de ser a única. Quando o livro foi publicado no final de 2005, já tinha terminado de escrever a primeira versão de Jogos de Guerra, que se passa na mesma época, mas com personagens diferentes. Em seguida tive vários contos publicados online e um na revista Scarium. De lá para cá também lancei dois ebooks sobre algumas das raças alienígenas desse UF para o mercado de RPG internacional e um RPG com sistema próprio para o mercado nacional.
Antes do Taikodom, fui um dos fundadores de um grupo chamado SomniumStudio, que pretendia lançar jogos de computador no Brasil. Chegamos a ser convidados a palestrar sobre o assunto em algumas universidades do Rio de Janeiro. Nessa época chegamos a trabalhar em alguns projetos como a Nave-Escola do Planetário da Gávea, no Rio de Janeiro, quando desenvolvemos um simulador espacial com física realista, além de projetos em multimídia. Nessa mesma época estávamos trabalhando no desenvolvimento de um space sim chamado Border Wars, com um Universo Ficcional desenvolvido por mim.
Mas, talvez a origem dessa relação escrita+jogos tenha sido um período de quatro anos em que desenvolvi e mestrei através da internet um RPG de sistema próprio baseado na série de jogos Wing Commander. Chegamos a ter 30 jogadores de todo o mundo. Foi apenas a falta de tempo que nos privou de continuar esse projeto. Sei que aprendi muito dessa época o que aplico hoje no desenvolvimento de Taikodom.
Sobre o processo de criação deste romance, qual a diferença entre trabalhar com um universo criado por outra pessoa e a liberdade de criar seu próprio mundo como fez em Véu da verdade? É comparável com o que você já havia feito em termos de fanfics, por exemplo, ou é uma experiência diferente?
Nunca é igual. Mesmo de um UF compartilhado para outro, de um fanfic para outro, existe muita diferença. Alguns UFs são extremamente detalhados, deixando pouco espaço para desenvolvimento, enquanto outros são propositalmente abertos.
O Véu da verdade foi um exercício e um desafio que resolvi impor a mim. No Reveillon de 2004, enquanto discutia com o pessoal da SomniumStudio sobre algumas questões do UF do Border Wars (que, mal ou bem tinha limitações técnicas e de foco, assim como o Taikodom), resolvi jogar todas as idéias mais loucas que tivesse na gênese de um novo UF. Algo totalmente sem barreiras, puxando crítica social, comédia no estilo Mochileiro das galáxias e um pacotão de ação e intriga. Um ano depois, publicava o primeiro romance da série. Foi muito divertido e extremamente gratificante. Afinal, foi meu portfólio para entrar na Hoplon.
No caso do Taikodom, por ser um universo em desenvolvimento (especialmente em 2006, quando me tornei parte do projeto), apesar de existirem certos elementos já definidos, havia muito a se criar. Parte do meu trabalho ao ser contratado pela Hoplon foi encontrar buracos e preenchê-los com detalhes que dessem pano pra manga. Foi parte do motivo pelo qual acabei trabalhando bastante no período em que o jogo se passa hoje, um período o qual ainda não havia sido trabalhado pelo Gerson [Lodi-Ribeiro] e o Roctávio [de Castro]. Enquanto no início você tem que se acostumar com certas nuances do UF, logo certas coisas se tornam naturais. Essa é a vantagem de um UF desenvolvido meticulosamente por um grupo de pessoas dedicadas ao projeto. A cada encontro (virtual ou físico), surge pelo menos uma nova idéia de como explorar esse universo.
Qual foi a responsabilidade de abrir as portas deste universo ficcional antes mesmo do criador dele, já que seu romance foi lançado primeiramente que a coletânea de contos de Gerson Lodi-Ribeiro, que assina a introdução de seu livro, aliás?
Bom, na verdade o Taikodom foi criado pelo Tarqüínio Teles e Cristóvão Buzarello, dois dos sócios da Hoplon. O Gerson é sim o principal autor e certamente sem ele não haveria muito do que se desenvolveu desde o início do projeto. Mas o que temos que lembrar é que, nesse momento inicial, o Taikodom é principalmente um jogo online. Foi por esse motivo que acabei sendo incumbido pelo Tarqüínio dessa responsabilidade. E que resposabilidade! Deu um frio na barriga quando ele disse, brincado sério, que eu deveria escrever o Hobbit [referência ao livro que antecede as obras mais conhecidas da saga de O senhor dos anéis, de J.R.R. Tolkien] da nossa Trilogia (que está nas mãos do Gerson). A decisão foi bem pensada pela diretoria da Hoplon. Despertar tem uma visão mais pessoal do UF, diretamente relacionada ao jogo o qual o romance apresenta. O passo seguinte é dar mais detalhes sobre esse UF, com as Crônicas do Taikodom, de autoria do Gerson, e as demais obras em seqüência. O frio na barriga do lançamento veio e veio forte. Agora é o momento da alegria de ouvir e ler os comentários sobre quem se interessou e leu.
No caso deste livro, não só era um universo que já existia previamente, mas também um trabalho que envolve a parceria com outros criadores. Como foi sua interação com Gerson Lodi-Ribeiro, Roctávio de Castro e outros membros da equipe de criação? Há uma cooperação entre vocês nas diversas mídias que o projeto envolve?
Tem que ter uma cooperação. Sem ela, seria impossível desenvolver um Universo Compartilhado. Durante muito tempo, em especial do início dessa parceria, em que muito sobre o UF do Taikodom estava sendo discutido, que tínhamos reuniões via skype duas vezes por mês e trocas de emails praticamente diárias. Todo ano temos pelo menos um fim de semana prolongado de discussões sobre os detalhes mais importantes. Com o tempo, todos nos tornamos mais seguros do que criamos juntos e do entendimento dos demais. Discutimos idéias e trechos de novas obras, comentamos em cima, jogamos mais idéias e às vezes acabamos com mais idéias para novas histórias. Hoje temos personagens criados por um andando nas histórias dos outros. Isso se tornou uma diversão, ver como nossas criações aparecem pelas palavras de outro autor. Foi o que permitiu que personagens como Júlia Honoré, criada pelo Roctávio, e Antoniadis, criado pelo Gerson, ganhassem papéis importantes no jogo e no Despertar. E esse é só o início.
E o envolvimento de outros membros da equipe? Ao todo são quantas pessoas envolvidas direta e indiretamente com todo o projeto Taikodom?
Muitas! Hoje acredito que já passe dos 70 colaboradores diretos, além de tercerizados e equipes de outros projetos da Hoplon. Existe um envolvimento geral, mesmo que nem sempre oficial. Quase todo o dia alguém aparece na baia do departamento de Conteúdo do Taikodom com algumas idéias para o jogo. Pode ser um personagem, uma história, um elemento de jogo... ou às vezes só perguntar os porquês. A verdade é que, na prática, o UF do Taikodom é criado a cada dia por toda a equipe e, claro, também pelos jogadores. Dentro do próprio departamento de Conteúdo temos um envolvimento bem grande com a criação desse UF. Por exemplo, o Paulo de Tarso é meio que nosso escritor invisível. Ele tem um estilo de escrita que garantiu que eu separasse alguns personagens do jogo para serem exclusivos dele. Tanto que ele foi um dos hoplitas imortalizados no UF ganhando um personagem próprio. No caso dele, o repórter intrometido Wayne Mesquita Jr, criado pelo próprio PDT.
Há pelo menos uma citação explícita a uma outra obra do gênero space opera no livro, quando um dos protagonistas menciona os cavaleiros jedi. Os filmes da série Star wars são uma de suas influências em termos de ficção científica? Que outras poderia apontar entre literatura, cinema, seriados de TV, quadrinhos e vídeo games?
Sempre fui fascinado por combates espaciais, com caças disparando mísseis e fazendo piruetas enquanto explosões gigantescas tomam o espaço. Foi isso que me tornou fã de Guerras nas estrelas. Tanto que tenho a coleção completa de quadrinhos e romances da série X-Wing, mas tenho pouco sobre cavaleiros jedi e afins.
Acho que influências são tantas. Em especial nos jogos. Fui começar a ler romances relativamente tarde. O que me prendeu à ficção científicia foi, em primeiro lugar, os jogos de computador como a série Wing Commander e jogos da série do Guerras nas estrelas, como X-Wing e Tie Fighter, e de estratégia como Masters of Orion 2. Tanto que o primeiro romance de ficção científica que lembro ter comprado foi End Run, um dos primeiros romances da série Wing Commander.
De lá para cá, foram muitos livros. Sou fã descarado da série clássica do Battletech, desde o jogo de tabuleiro ao RPG e à coleção de pra mais de 50 romances que tenho aqui em casa. E sei que muito do meu estilo de narrativa, de combate, ação e intriga, vêm de livros dessas séries.
Na TV e no cinema menciono do que vêm à mente Cowboy Bebop, Babylon 5, Firefly, Earth above and beyond, Último guerreiro das estrelas, Quinto elemento e Eclipse mortal. Acho que até na minha infância eu pesco influências de desenhos como Transformers, Galaxy Rangers, Macross, Mask, Silverhawks e sabe-se lá mais o quê.
Taikodom: Despertar vai ser a única aparição de Jorge Santiago e de Augusto Carrera ou você e seus parceiros da Hoplon têm outros planos para a dupla e para outros personagens seus que aparecem nesta primeira trama?
Despertar é apenas o começo. Já tenho outra história esquematizada e com algumas cenas escritas que serve como uma continuação, mas ainda não tenho previsão para escrevê-la. Mas ambos poderão dar as caras em outras obras, inclusive no novo romance que comecei a trabalhar agora ou mesmo no jogo. A trilogia que o Gerson está escrevendo também inclui personagens meus e do Roctávio. Quais? Vocês vão ter que esperar mais um pouquinho para saber!
Quanto ao game, ele acaba de ser apresentado ao grande público, após mais de quatro anos de desenvolvimento. Quais são as expectativas da equipe para as próximas fases deste empreendimento que, muito provavelmente, é o maior e mais ousado da história da ficção científica brasileira?
O projeto é dividido em várias partes. E cada parte lançada é uma nova conquista para nós. Nossas expectativas são de sucesso, claro! Desde o início a Hoplon teve em mente o mundo, e será nossa grande conquista para o ano de 2009. O Taikodom tem tido uma repercussão incrível entre os entendidos da indústria no exterior. Mais do que esperávamos para nosso modesto lançamento nacional do módulo de ação. O sucesso nacional e os sinais de sucesso internacional têm nos dado um grande apoio e fôlego para a longa jornada que ainda está pela frente. Acreditamos que será uma excelente forma de colocar o Brasil em evidência lá fora no mercado dos jogos e, claro, também no mercado literário. Além do mais, os planos para o exterior não se limitam apenas ao jogo.
Taikodom é descrito como o primeiro Massive Social Game do mundo. Você poderia descrever quais são os diferenciais dele para outros games on line existentes e o porquê desse "Social" na sua denominação?
Mundos virtuais hoje, sejam jogos ou ‘vidas secundárias’, são fechados em estilos bem específicos. Mesmo no que se trata de mundos caixas de areia (aqueles em que você está livre para fazer o que quiser), existe uma limitação no que realmente é possível ser feito. Isso geralmente é relacionado ao gênero do jogo. No MSG, o que temos é mais do que um simples jogo ou ambiente virtual. É tudo isso e mais um pouco. O Taikodom alcançará um estágio em que jogadores de space sim, jogos de estratégia, jogos corporativos e os casuais que gostam apenas de interagir em um mundo virtual poderão encontrar-se em um ambiente compartilhado em que as ações de um podem afetar a vida de outros. Então você pode ter uma pessoa que entra no Taikodom apenas para administrar um bar virtual. Nesse bar, um grupo de jogadores do jogo de ação discutem um combate que foi planejado por um jogador do jogo estratégico, porque outro jogador, presidente de uma corporação virtual, promoveu um embargo econômico que, por sua vez, pode ter afetado o fornecimento de cerveja para o dono do bar. Quem sabe não foi esse dono de bar que contratou o esquadrão de mercenários para garantir que o fornecimento voltasse ao normal?
E quanto a outros projetos seus, dentro e fora do Domínio do Espaço? Há alguma novidade que você possa antecipar?
Comecei a trabalhar em um novo romance para o Taikodom. A história tem início mais ou menos no meio do Despertar e terá algumas relações com os eventos do primeiro livro, mas trata-se de outros personagens e outro conflito. Esperem encontrar algumas caras conhecidas tanto do Despertar quanto do jogo.
Fora do Taikodom, tenho trabalhado um pouco no UF do Véu da verdade, escrevendo alguns contos e voltando a investir numa publicação do Jogos de Guerra. Mas tenho me focado mais em duas novelas para o Universo Compartilhado de space opera da Fábrica dos Sonhos, um grupo online de escritores. Fiquei meio desligado do projeto uns meses, mas voltei para terminar a primeira novela durante as férias de fim de ano.
Fugindo um pouco da ficção científica, venho trabalhando há uns dois anos em um mundo de fantasia que é tão grande que dá espaço para tudo quanto é tipo de história, da fantasia infantil de fadas e gnomos ao dark estilo The Black Company, a fantasia rpgística até um New Weird alá Méville [autor do já clássico Perdido Street Station]. Tudo interligado, claro, para evitar o efeito colcha de retalhos. Tenho várias histórias estruturadas e algumas cenas escritas, mas agora estou focado no infanto-juvenil para variar um pouco. De resto, só o futuro sabe!
Antes do lançamento de Taikodom: Despertar e de ser contratado como game designer pela empresa responsável pelo projeto, a Hoplon, você já tinha experiência tanto literária quanto com jogos, certo? Poderia falar um pouco sobre seus livros, impresso e on-line, anteriores e sobre outros games com que trabalhou?
Bom, meu primeiro livro impresso foi Véu da verdade, uma ficção Space Opera em um universo próprio. A proposta dele era criar um universo ficcional com estilo próprio, com um jeitinho brasileiro, e com espaço o suficiente para vários tipos de história não necessariamente interligadas. O Véu foi a primeira, mas longe de ser a única. Quando o livro foi publicado no final de 2005, já tinha terminado de escrever a primeira versão de Jogos de Guerra, que se passa na mesma época, mas com personagens diferentes. Em seguida tive vários contos publicados online e um na revista Scarium. De lá para cá também lancei dois ebooks sobre algumas das raças alienígenas desse UF para o mercado de RPG internacional e um RPG com sistema próprio para o mercado nacional.
Antes do Taikodom, fui um dos fundadores de um grupo chamado SomniumStudio, que pretendia lançar jogos de computador no Brasil. Chegamos a ser convidados a palestrar sobre o assunto em algumas universidades do Rio de Janeiro. Nessa época chegamos a trabalhar em alguns projetos como a Nave-Escola do Planetário da Gávea, no Rio de Janeiro, quando desenvolvemos um simulador espacial com física realista, além de projetos em multimídia. Nessa mesma época estávamos trabalhando no desenvolvimento de um space sim chamado Border Wars, com um Universo Ficcional desenvolvido por mim.
Mas, talvez a origem dessa relação escrita+jogos tenha sido um período de quatro anos em que desenvolvi e mestrei através da internet um RPG de sistema próprio baseado na série de jogos Wing Commander. Chegamos a ter 30 jogadores de todo o mundo. Foi apenas a falta de tempo que nos privou de continuar esse projeto. Sei que aprendi muito dessa época o que aplico hoje no desenvolvimento de Taikodom.
Sobre o processo de criação deste romance, qual a diferença entre trabalhar com um universo criado por outra pessoa e a liberdade de criar seu próprio mundo como fez em Véu da verdade? É comparável com o que você já havia feito em termos de fanfics, por exemplo, ou é uma experiência diferente?
Nunca é igual. Mesmo de um UF compartilhado para outro, de um fanfic para outro, existe muita diferença. Alguns UFs são extremamente detalhados, deixando pouco espaço para desenvolvimento, enquanto outros são propositalmente abertos.
O Véu da verdade foi um exercício e um desafio que resolvi impor a mim. No Reveillon de 2004, enquanto discutia com o pessoal da SomniumStudio sobre algumas questões do UF do Border Wars (que, mal ou bem tinha limitações técnicas e de foco, assim como o Taikodom), resolvi jogar todas as idéias mais loucas que tivesse na gênese de um novo UF. Algo totalmente sem barreiras, puxando crítica social, comédia no estilo Mochileiro das galáxias e um pacotão de ação e intriga. Um ano depois, publicava o primeiro romance da série. Foi muito divertido e extremamente gratificante. Afinal, foi meu portfólio para entrar na Hoplon.
No caso do Taikodom, por ser um universo em desenvolvimento (especialmente em 2006, quando me tornei parte do projeto), apesar de existirem certos elementos já definidos, havia muito a se criar. Parte do meu trabalho ao ser contratado pela Hoplon foi encontrar buracos e preenchê-los com detalhes que dessem pano pra manga. Foi parte do motivo pelo qual acabei trabalhando bastante no período em que o jogo se passa hoje, um período o qual ainda não havia sido trabalhado pelo Gerson [Lodi-Ribeiro] e o Roctávio [de Castro]. Enquanto no início você tem que se acostumar com certas nuances do UF, logo certas coisas se tornam naturais. Essa é a vantagem de um UF desenvolvido meticulosamente por um grupo de pessoas dedicadas ao projeto. A cada encontro (virtual ou físico), surge pelo menos uma nova idéia de como explorar esse universo.
Qual foi a responsabilidade de abrir as portas deste universo ficcional antes mesmo do criador dele, já que seu romance foi lançado primeiramente que a coletânea de contos de Gerson Lodi-Ribeiro, que assina a introdução de seu livro, aliás?
Bom, na verdade o Taikodom foi criado pelo Tarqüínio Teles e Cristóvão Buzarello, dois dos sócios da Hoplon. O Gerson é sim o principal autor e certamente sem ele não haveria muito do que se desenvolveu desde o início do projeto. Mas o que temos que lembrar é que, nesse momento inicial, o Taikodom é principalmente um jogo online. Foi por esse motivo que acabei sendo incumbido pelo Tarqüínio dessa responsabilidade. E que resposabilidade! Deu um frio na barriga quando ele disse, brincado sério, que eu deveria escrever o Hobbit [referência ao livro que antecede as obras mais conhecidas da saga de O senhor dos anéis, de J.R.R. Tolkien] da nossa Trilogia (que está nas mãos do Gerson). A decisão foi bem pensada pela diretoria da Hoplon. Despertar tem uma visão mais pessoal do UF, diretamente relacionada ao jogo o qual o romance apresenta. O passo seguinte é dar mais detalhes sobre esse UF, com as Crônicas do Taikodom, de autoria do Gerson, e as demais obras em seqüência. O frio na barriga do lançamento veio e veio forte. Agora é o momento da alegria de ouvir e ler os comentários sobre quem se interessou e leu.
No caso deste livro, não só era um universo que já existia previamente, mas também um trabalho que envolve a parceria com outros criadores. Como foi sua interação com Gerson Lodi-Ribeiro, Roctávio de Castro e outros membros da equipe de criação? Há uma cooperação entre vocês nas diversas mídias que o projeto envolve?
Tem que ter uma cooperação. Sem ela, seria impossível desenvolver um Universo Compartilhado. Durante muito tempo, em especial do início dessa parceria, em que muito sobre o UF do Taikodom estava sendo discutido, que tínhamos reuniões via skype duas vezes por mês e trocas de emails praticamente diárias. Todo ano temos pelo menos um fim de semana prolongado de discussões sobre os detalhes mais importantes. Com o tempo, todos nos tornamos mais seguros do que criamos juntos e do entendimento dos demais. Discutimos idéias e trechos de novas obras, comentamos em cima, jogamos mais idéias e às vezes acabamos com mais idéias para novas histórias. Hoje temos personagens criados por um andando nas histórias dos outros. Isso se tornou uma diversão, ver como nossas criações aparecem pelas palavras de outro autor. Foi o que permitiu que personagens como Júlia Honoré, criada pelo Roctávio, e Antoniadis, criado pelo Gerson, ganhassem papéis importantes no jogo e no Despertar. E esse é só o início.
E o envolvimento de outros membros da equipe? Ao todo são quantas pessoas envolvidas direta e indiretamente com todo o projeto Taikodom?
Muitas! Hoje acredito que já passe dos 70 colaboradores diretos, além de tercerizados e equipes de outros projetos da Hoplon. Existe um envolvimento geral, mesmo que nem sempre oficial. Quase todo o dia alguém aparece na baia do departamento de Conteúdo do Taikodom com algumas idéias para o jogo. Pode ser um personagem, uma história, um elemento de jogo... ou às vezes só perguntar os porquês. A verdade é que, na prática, o UF do Taikodom é criado a cada dia por toda a equipe e, claro, também pelos jogadores. Dentro do próprio departamento de Conteúdo temos um envolvimento bem grande com a criação desse UF. Por exemplo, o Paulo de Tarso é meio que nosso escritor invisível. Ele tem um estilo de escrita que garantiu que eu separasse alguns personagens do jogo para serem exclusivos dele. Tanto que ele foi um dos hoplitas imortalizados no UF ganhando um personagem próprio. No caso dele, o repórter intrometido Wayne Mesquita Jr, criado pelo próprio PDT.
Há pelo menos uma citação explícita a uma outra obra do gênero space opera no livro, quando um dos protagonistas menciona os cavaleiros jedi. Os filmes da série Star wars são uma de suas influências em termos de ficção científica? Que outras poderia apontar entre literatura, cinema, seriados de TV, quadrinhos e vídeo games?
Sempre fui fascinado por combates espaciais, com caças disparando mísseis e fazendo piruetas enquanto explosões gigantescas tomam o espaço. Foi isso que me tornou fã de Guerras nas estrelas. Tanto que tenho a coleção completa de quadrinhos e romances da série X-Wing, mas tenho pouco sobre cavaleiros jedi e afins.
Acho que influências são tantas. Em especial nos jogos. Fui começar a ler romances relativamente tarde. O que me prendeu à ficção científicia foi, em primeiro lugar, os jogos de computador como a série Wing Commander e jogos da série do Guerras nas estrelas, como X-Wing e Tie Fighter, e de estratégia como Masters of Orion 2. Tanto que o primeiro romance de ficção científica que lembro ter comprado foi End Run, um dos primeiros romances da série Wing Commander.
De lá para cá, foram muitos livros. Sou fã descarado da série clássica do Battletech, desde o jogo de tabuleiro ao RPG e à coleção de pra mais de 50 romances que tenho aqui em casa. E sei que muito do meu estilo de narrativa, de combate, ação e intriga, vêm de livros dessas séries.
Na TV e no cinema menciono do que vêm à mente Cowboy Bebop, Babylon 5, Firefly, Earth above and beyond, Último guerreiro das estrelas, Quinto elemento e Eclipse mortal. Acho que até na minha infância eu pesco influências de desenhos como Transformers, Galaxy Rangers, Macross, Mask, Silverhawks e sabe-se lá mais o quê.
Taikodom: Despertar vai ser a única aparição de Jorge Santiago e de Augusto Carrera ou você e seus parceiros da Hoplon têm outros planos para a dupla e para outros personagens seus que aparecem nesta primeira trama?
Despertar é apenas o começo. Já tenho outra história esquematizada e com algumas cenas escritas que serve como uma continuação, mas ainda não tenho previsão para escrevê-la. Mas ambos poderão dar as caras em outras obras, inclusive no novo romance que comecei a trabalhar agora ou mesmo no jogo. A trilogia que o Gerson está escrevendo também inclui personagens meus e do Roctávio. Quais? Vocês vão ter que esperar mais um pouquinho para saber!
Quanto ao game, ele acaba de ser apresentado ao grande público, após mais de quatro anos de desenvolvimento. Quais são as expectativas da equipe para as próximas fases deste empreendimento que, muito provavelmente, é o maior e mais ousado da história da ficção científica brasileira?
O projeto é dividido em várias partes. E cada parte lançada é uma nova conquista para nós. Nossas expectativas são de sucesso, claro! Desde o início a Hoplon teve em mente o mundo, e será nossa grande conquista para o ano de 2009. O Taikodom tem tido uma repercussão incrível entre os entendidos da indústria no exterior. Mais do que esperávamos para nosso modesto lançamento nacional do módulo de ação. O sucesso nacional e os sinais de sucesso internacional têm nos dado um grande apoio e fôlego para a longa jornada que ainda está pela frente. Acreditamos que será uma excelente forma de colocar o Brasil em evidência lá fora no mercado dos jogos e, claro, também no mercado literário. Além do mais, os planos para o exterior não se limitam apenas ao jogo.
Taikodom é descrito como o primeiro Massive Social Game do mundo. Você poderia descrever quais são os diferenciais dele para outros games on line existentes e o porquê desse "Social" na sua denominação?
Mundos virtuais hoje, sejam jogos ou ‘vidas secundárias’, são fechados em estilos bem específicos. Mesmo no que se trata de mundos caixas de areia (aqueles em que você está livre para fazer o que quiser), existe uma limitação no que realmente é possível ser feito. Isso geralmente é relacionado ao gênero do jogo. No MSG, o que temos é mais do que um simples jogo ou ambiente virtual. É tudo isso e mais um pouco. O Taikodom alcançará um estágio em que jogadores de space sim, jogos de estratégia, jogos corporativos e os casuais que gostam apenas de interagir em um mundo virtual poderão encontrar-se em um ambiente compartilhado em que as ações de um podem afetar a vida de outros. Então você pode ter uma pessoa que entra no Taikodom apenas para administrar um bar virtual. Nesse bar, um grupo de jogadores do jogo de ação discutem um combate que foi planejado por um jogador do jogo estratégico, porque outro jogador, presidente de uma corporação virtual, promoveu um embargo econômico que, por sua vez, pode ter afetado o fornecimento de cerveja para o dono do bar. Quem sabe não foi esse dono de bar que contratou o esquadrão de mercenários para garantir que o fornecimento voltasse ao normal?
E quanto a outros projetos seus, dentro e fora do Domínio do Espaço? Há alguma novidade que você possa antecipar?
Comecei a trabalhar em um novo romance para o Taikodom. A história tem início mais ou menos no meio do Despertar e terá algumas relações com os eventos do primeiro livro, mas trata-se de outros personagens e outro conflito. Esperem encontrar algumas caras conhecidas tanto do Despertar quanto do jogo.
Fora do Taikodom, tenho trabalhado um pouco no UF do Véu da verdade, escrevendo alguns contos e voltando a investir numa publicação do Jogos de Guerra. Mas tenho me focado mais em duas novelas para o Universo Compartilhado de space opera da Fábrica dos Sonhos, um grupo online de escritores. Fiquei meio desligado do projeto uns meses, mas voltei para terminar a primeira novela durante as férias de fim de ano.
Fugindo um pouco da ficção científica, venho trabalhando há uns dois anos em um mundo de fantasia que é tão grande que dá espaço para tudo quanto é tipo de história, da fantasia infantil de fadas e gnomos ao dark estilo The Black Company, a fantasia rpgística até um New Weird alá Méville [autor do já clássico Perdido Street Station]. Tudo interligado, claro, para evitar o efeito colcha de retalhos. Tenho várias histórias estruturadas e algumas cenas escritas, mas agora estou focado no infanto-juvenil para variar um pouco. De resto, só o futuro sabe!
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